O TERMÔMETRO

O TERMÔMETRO

Tive um sonho engraçado, em que me aparece à frente e atrás de um balcão, um hominho magro e quase pequeno, um rapaz, que tanto podia ser trinta ou quarenta anos, de uma idade indefinida, pois o que mais o definia era a mediocridade e aquela indefinição de procedência ou de posto que ocupe no seu trabalho, enfim esses tipos que a gente nem nota no passar da vida. Ele tinha uma postura de galinho de briga, as mãos seguravam o balcão e os braços estendidos bem esticados mantinham seu corpo afastado e hirto, como que pronto para o que desse e viesse.

Eu por minha parte, no sonho, nem sabia o que eu fazia ali, um ambiente mal iluminado que, além do balcão, nada mais se distinguia ali, exceto o rapaz galinho-de-briga, que me surpreende antes que eu fale alguma coisa, ele, olho no olho diz direto e com toda a veemência:

"Não, não é nada disso e não sei do que se trata."

Com estas palavras, acordei de estalo daquele sonho sem sentido e quase morri de rir só lembrando aquela figura e dizeres assim tão expressivos na energia dele e também inexpressivos, pois, afinal, não me diziam nada. E agora ainda rio porque foi inusitado.

Bolas porque sonhei Isso?

Lembrei da minha filha que me telefonara contando que passara mal no dia anterior, indisposta e com febre o dia todo, o que acabou conseguindo achar um telefone de farmácia mais próxima e pediu um tilenol e um termômetro. É atendida com um pouco de demora, toma o remédio e vai medir a febre. Com asco, nota que o termômetro era já usado, sem o lacre e sujo. Ficou possessa. Ela que é profissional no ramo de remédios, formada em microbiologia, passou a mão no telefone e deu o maior esporro no vendedor da farmácia, que aquilo era um absurdo, que a farmácia tem que ficar com o farmacêutico de prontidão, que ela podia denunciar e acabar com o negócio deles, falou bravo e com autoridade porque é especialista naquele setor, que aquilo podia infectar a todos os fregueses da farmácia que ele atendia e que devia estar usando aquele termômetro em todo mundo. Ao que o rapaz falou “não senhora, usei só num bebezinho, pois havia acabado o estoque de termômetros na farmácia”. Aí piorou e ela brigou mais enérgica ainda, o quê? O senhor acha que no cuzinho do bebê não vai ter bactérias, vírus, o diabo, toda sorte de infecções só porque é um bebê, seu ignorante! Na proporção que ela falava, o homem encolhia e ela suava aos montes, indignada. O rapaz: “na terça-feira, prometo que lhe mando um novo para trocar”. Aí piorou, pois essa ocorrência foi no sábado, ela virou fera: “o quê? Eu estou com febre hoje, agora!”.

Ligou-me contando, desesperada, insultada por esse país inculto e irresponsável... Mãe eu quero matar esse cara! Sugeri dela não tratar mal o entregador que ele não tinha nada com o problema. Só valeu uma coisa, mãe, é que suei tanto que acho que a febre passou...

Mais tarde ligou de novo contando o que fizera.

Num papel escreveu como se esteriliza um termômetro com todos os detalhes e mandou entregar para o vendedor:

Fazer uma mistura de 70% de álcool e 30% de água e deixar o termômetro ali mergulhado por quinze minutos.

MLUIZA MARTINS