PARAÍSO DO ATLÂNTICO
Em virtude da política de marginalização da classe média e da recessão que açoita os brasileiros, tivemos que escolher onde passar nossas férias nos limites de um raio máximo de 500 km do Rio.
Graças a essa restrição descobrimos Arraial do Cabo, conhecido como “Paraíso do Atlântico”, em Janeiro de 1992. Entretanto, já por volta de 1503 o cosmógrafo italiano Américo Vespúcio, a serviço de Portugal, teria tido o nosso mesmo prazer, ao aportar na Praia do Cabo da Rama, hoje denominada Praia dos Anjos.
Arraial do Cabo é, portanto, uma das localidades mais antigas e, primitivamente, era habitada por índios tamoios e goitacazes, da nação tupinambá. Assim como hoje é disputada por turistas, naquela época existia uma acirrada disputa entre portugueses e corsários ingleses, franceses e holandeses.
O Governo português, para rechaçar as investidas dos corsários, resolveu fundar a Capitania de São Tomé, da qual essa região passou a fazer parte. Só por volta de 1615, é que Constantino, ajudado por Mem de Sá e pelo índio Araribóia, conseguiu expulsar os invasores.
Apesar das limitações financeiras, reconhecemos que o incrível, o inacreditável coloriram tanto nossas férias, que resolvemos registrá-las.
Como num encantamento, no primeiro minuto das férias, uma gaivota, de dorso negro e branco papo, pousou em meu ombro e sussurrou, como uma amante no ato :
Bem vindo, serei tua guia em Arraial do Cabo…
Misturam-se a alegria do encontro, o espanto do inesperado e o medo das alturas. Encontro-me navegando no dorso negro da minha gaivota-guia.
Como para acalmar-me, desviou minha atenção falando:
"A área do município é de 158 km² dos quais 90% são restingas e 10% morros com declividade acentuada. Como grande parte dessa área representa a Lagoa de Araruama e 25km² pertencem à empresa produtora de barrilha – Companhia Álcalis, resta uma pequena parte para ocupação, que observarás que ocorreu de forma desordenada".
Voamos como um foguete no sentido vertical. Do alto a visão do litoral. De um lado as praias do Pontal e Foguete se juntam à do Forte, em Cabo Frio. Do outro, as praias: Grande; Figueira; e Massambaba se unem a outras até Jurujuba em Niterói: é mar, é sol, é sal e é sul. È Rio…
O silêncio e o prazer de voar foram interrompidos pela responsabilidade da guia de ter que nos ajudar a explorar Arraial do Cabo. Iniciou sua apresentação sobrevoando a mesma praia que Américo Vespúcio aportara, comentando:
"Tal como Copacabana, no Rio, e Iracema, em Fortaleza, também, já foi praia de primeira grandeza. Hoje é porto de barcos, receptora de dejetos tratados, campo de futebol de brotinhos e marmanjos. É a Praia dos Anjos. Em torno dela, podes visitar o Marco comemorativo da chegada de Américo Vespúcio, o Poço D’Água que, durante muito tempo, abasteceu a antiga Vila dos Pescadores".
"Podes conhecer e orar na Igreja de Nossa Senhora dos Remédios, considerada uma das primeiras edificações do país, construída pelos portugueses, em 1506. Podes, ainda, visitar o Museu Oceanográfico e o Aquário do Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira, onde encontrarás o esqueleto de uma baleia orca de 6,21m e 2 t, encalhada e morta em 05/09/81, bem como o Opah, ou Peixe Rei, que é muito difícil de ser capturado por viver cerca de 400 m de profundidade".
Voamos em direção ao azul infinito, enquanto aos gritos prometia: “conhecerás, agora, os outros recantos do meu berço azul”. Daí em diante, descobri as outras belezas de Arraial do Cabo, embalado pela poesia da minha gaivota-guia pois, para descrever o belo, ela o fez sempre com rimas.
"Filhas do oceano com a areia / gêmeas, são duas meninas / recantos de rara beleza / são as Prainhas";
"Incrustada no verde da montanha / e iluminada pelo sol, / lá está a Praia do Farol";
Ao voltar dos abraços com o rochedo, / a espuma branca da vaga / revela estreita renda de areia / da pequena e bela Praia Brava".
E, assim, com doces rimas da minha gaivota-guia, saboreei Praia do Forno, Praia Grande, Gruta Azul, Rocha de Nossa Senhora, Pedra da Gaivota, Pedra do Borrifador, Ponta do Focinho, Pedra do Oratório e o Pontal do Atalaia, onde terminamos nosso vôo assistindo a um por de sol inesquecível.
Escorreguei do dorso negro da gaivota e, sob os meus pés, outra vez o solo. Os lábios trêmulos pela emoção conseguem, pela primeira vez, falar: desejo te rever, mas como te identificar?
Então com um misto de timidez e graça confessou-me:
"Também, entre outros, não saberei te identificar".
Gorjeando e com a sabedoria dos que vivem em harmonia com a natureza, afirmou:
"Onde houver rochedo e mar / encontrarás milhares de gaivotas de dorso negro e branco papo / te seduzindo a um doce recordar / da fantasia de um vôo mágico / na pequenina, bela e azul Arraial do Cabo".
Quem visitar Arraial do Cabo e não encontrar uma Gaivota-guia, não deve afligir-se, nem resignar-se. Deve procurar incessantemente, mas sem descuidar-se da sabedoria milenar: “o belo, o mágico, a fantasia, o mistério e, até mesmo, o divino não estão fora, mas no interior de cada um de nós.
“Arraial do Cabo” é o nosso registro de gratidão a nossa ”gaivota –guia”. São nossas rimas e melodia, mal sucedidas na infantil ambição de pintar as cores do “Paraíso do Atlântico”.
ARRAIAL DO CABO
Disputada por corsários
num distante passado,
no presente, por turistas
a bela Arraial do Cabo.
Sonho azul de céu e mar,
festa verde de casuarinas
que, no balanço do ar,
se põem a cantar
a graça de suas “prainhas”.
Rochedos emergem como templos
do verde azul do mar,
tomando gaivotas como exemplos
num esforço em vão para voar.
Lembrando ao homem para ser grato,
a natureza escondeu, nesse leste do sul,
o recanto mágico de Arraial do Cabo:
sob as rochas e sobre o mar, a Gruta Azul.
Morros, dunas e rochedos
são, do recanto, o bordado.
quem, de ser feliz, não tiver medo,
deve conhecer Arraial do Cabo.