São Paulo
São seis horas da manhã e Paulo ainda dorme.
São quatro conduções até o terminal Santo Amaro e Paulo ainda está no segundo ônibus.
São quinhentos metros de caminhada e Paulo nem chegou na metade pois parou pra tomar café da manhã.
São nove horas da manhã e Paulo sequer leu cinco e-mails.
São trinta minutos para almoçar e Paulo já está há dez esperando na fila para se servir.
São uns idiotas esses caras que param a avenida Paulista e Paulo relembra os tempos de protestos do movimento estudantil na maior avenida.
São todos pilantras esses políticos e Paulo que sabe pouco de política se sente mal por ter votado em pelo menos um deles.
São um bando de loucos esses torcedores e Paulo lembra que também já foi de torcida organizada.
São todos uns fanáticos e Paulo que já foi convidado e foi numa dessas igrejas pseudo-cristãs.
São cinco estações de trem até chegar na casa da sogra e Paulo sofre para entrar pela porta.
São dois reais a caneta com caça-palavra vendidos pelo "suposto" cego e Paulo vai desafiar a lei da inércia tentando resolver o jogo em pé.
São só dez minutinhos e o bolo já sai, conforme disse a sogra e Paulo louco pra voltar pra casa pra assistir um filme do século passado que todos viram, menos ele.
São dois caras meio suspeitos que vem vindo lá e Paulo já vai ficando alerta.
São três filhos que já estão dormindo e Paulo lamenta o tempo que não tem para os filhos.
São dores de cabeça, nas costas, a pressão alta e Paulo que ainda depende da saúde pública.
São muitos os sonhos durante a noite mas Paulo sonha mesmo com a condição de pagar uma faculdade para si.
São tantos Paulos e por que não Paulas que trabalha, cria filhos, aguenta desaforo, espera na fila do hospital, se desespera com conta atrasada, luta pra manter uma família unida.
São Paulo é prova cabal da seleção natural, só resiste os fortes, os que vão além, os que lutam.
04/11/08