"LISBOA, VELHA CIDADE..."

UM LIVRO DE ALEXANDRE O´NEILL,

PRESENTE DE DRUMMOND.

Nelson Marzullo Tangerini

Pouco lido no Brasil, o poeta Alexandre O´Neill é um dos grandes poetas de Portugal.

Sabendo de minha admiração pelo poeta português, Drummond me envia um livro que recebeu de Alexandre, com dedicatória e autógrafo do lisboeta ao itabirano –

“Alexandre O´Neill

Rua da Saudade, 23 – 2º Dto.

Lisboa.”

“Para Drummond

com um abraço

do seu velho

admirador

O´Neill (*)

(*) Grato pela antologia!”

- , e mo envia com dedicatória e um autógrafo seus.

“Nelson Tangerini:

Também sou admirador do O´Neill. Como você igualmente gosta da poesia dele, espero que dê valor a esta lembrança.

Carlos Drummond de Andrade

Rio, setembro, 1982.”

Quando estive em Lisboa, em abril de 2002, acompanhando o escritor e historiador português Edgar Rodrigues, que, fugindo da ditadura de António de Oliveira Salazar, por aqui ficou, constituindo família, levei este livro na bagagem. Era um desejo antigo conhecer Portugal, terra de meu bisavô Manuel Gomes Soares, natural de Viseu, o Rio Tejo, cantado por inúmeros poetas, como Fernando Pessoa, um dos maiores nomes da poesia portuguesa, e ler um de seus poemas, O Tejo corre no Tejo, o que mais me tocou - do livro Feira Cabisbaixa -, na travessia de Lisboa para Cacilhas, Almada, do outro lado do Tejo.

Eis o poema:

“Tu que passas por mim tão indiferente,

no teu correr vazio de sentido,

na memória que sobes lentamente,

do mar para a nascente,

és o curso do tempo já vivido.

Não, Tejo,

Não é tu que em te vês,

- sou eu que em ti me vejo!

Por isso, à tua beira se demora

aquele que a saudade ainda trespassa,

repetindo a lição, que não decora,

de ser, aqui e agora,

só um homem a olhar pra o que passa.

Não, Tejo,

Não és tu que em mim te vês,

- sou eu que em ti me vejo!

Um voo desferido é uma gaivota,

não é o voo da imaginação;

gritos não são agoiros, são a lota...

Vá, não faças batota,

deixa ficar as coisas onde estão...

Não, Tejo,

Não és tu que em mim de vês,

- Sou eu que em ti me vejo!

Tejo desta canção, que o teu correr

não seja o meu pretexto de saudade.

Saudade tenho, sim, mas de perder,

as águas vivas da realidade!

Não, Tejo,

Não és tu que em mim te vês,

- Sou eu, em mim, que me vejo!”

Depois de andar pelas ruas de Lisboa e, principalmente, pela Rua da Saudade, a relembrar versos de O´Neill, escrevi-lhe, em 29/4/2002, à moda portuguesa, in memoriam, uma poesia:

“SAUDADE DE ALEXANDRE O´NEILL

Vim a Lisboa para ver-te.

Li e reli

“O Tejo corre no Tejo”.

Gostava de recitar-te esta poesia.

Lembrei-me de ti

quase sempre.

Principalmente

quando atravessei o rio

da tua canção.

Por que não estás aqui?

Por que deixaste Lisboa?

Paira no ar a tua ausência.

Sinto saudade de ti.”

Nelson Marzullo Tangerini, 53 anos, é escritor, jornalista, poeta, compositor fotógrafo e professor de Língua Portuguesa e Literatura. É membro do Clube dos Escritores Piracicaba [ clube.escritores@uol.com.br ], onde ocupa a Cadeira 073 – Nestor Tangerini.

nmtangerini@gmail.com, nmtangerini@yahoo.com.br

Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 03/11/2008
Código do texto: T1263145