A Internet

A Internet

suzabarbi@hotmail.com

Sou impressionada com as pessoas que freqüentam as salas de chat à caça de namorados.

Há pouco tempo atrás, quem estava nessa situação ia à luta propriamente dita.

Um bar ou uma sorveteria e o caçador caía em cima de sua presa.

Alvos de pele e osso.

Hoje, quem caça conversa com máquinas.

No orkut seleciona-se o alvo e no messenger atira-se nele sem piedade.

Afinal, na internet pode-se tudo: ser novos, magros, ricos.

The second life!

A mentira impera.

Não é uma regra geral, mas a maioria das pessoas mente quando o assunto é a caça virtual.

Nada mais fácil.

Você pode escolher sua idade e profissão, adorar Nina Simone quando gosta mesmo é de um pagodão e, se for testado, nada como consultar um site de pesquisa.

Tudo lá, para fazer sua mentira parecer a maior verdade do mundo.

Nunca foi tão fácil ser o objeto de desejo daquele que está do outro lado da máquina.

Foto?

Basta colocar alguma com você em seus tenros anos.

O que tenho visto de foto de gente bonita no orkut, ninguém tem idéia.

Mas sei que nem de longe são assim.

Aconteceu com a sobrinha de uma amiga que pediu meu endereço no msn.

Quando começamos nosso bate-papo, apareceu uma foto. Na maior ingenuidade, perguntei:

- Quem é essa na foto?

Secamente, ela respondeu:

– Ué! Sou eu!

E me bloqueou.

No msn: a foto mostrava o perfil do rosto de uma linda moça com cabelos lisos.

Ao vivo: ela é uma moça bem gorda, cabelo crespo, rosto lua cheia.

Entendi o perfil, o cabelo e ela ter me bloqueado.

Outra amiga foi alvo das salas de chat.

Resolveu ver como elas funcionavam.

Não demorou a encontrar um, claro, que adorava tudo que ela dizia gostar.

Mostrava ser uma pessoa inteligente, participante de grupos de estudo sobre Sartre, Freud e até Karl Marx.

Estabeleceu-se o contato e ela estava exultante.

– Dei uma sorte danada, dizia toda animada para as amigas. Entrei num chat e encontrei uma figura bacana. É culto e estamos combinando de nos encontrar. Mas vamos aguardar mais um pouco. Sabe como é, essas coisas têm que levar algum tempo.

Sei não, mas até um tempo atrás, o que demorava era pegar na mão, dar o primeiro beijo. Hoje, até sexo se faz virtualmente, menos conhecer a pessoa.

Enfim...

O tempo foi passando e ela notou que ele escrevia errado.

Ela se preocupou.

Como um homem tão culto podia escrever um português tão truncado?

Mais algum tempo de internet, ela percebeu que muitas vezes ele dizia que ia à cozinha pegar alguma coisa e ela ficava longos minutos esperando que ele voltasse. Tempo o suficiente para ele fazer um sacolão.

Ela achou que era hora deles se encontrarem.

Quando ele apareceu, tudo se explicou.

Ele era diabético, não enxergava nada bem da única vista que lhe restou e, para completar, não tinha uma das pernas. Estavam explicados o português tão truncado e a demora nas idas à cozinha.

Surpresas à parte, a internet também é uma provedora de casamentos em crise.

Dois filhos, ela e o casamento à beira de um ataque de nervos, resolveu entrar no orkut.

Encontrou o que procurava: aquele namorado que quase a levou a casar-se com Jesus na adolescência.

Pela foto no msn, os anos não passaram para ele.

Estava tal e qual era aos 18 anos.

Resolveram se encontrar.

Local e horário marcados, lá foi ela achando que viveria novamente suas emoções de adolescente.

Parou o carro e esperou.

Estaria esperando até hoje, não fosse vê-lo, um dia, saindo de uma loja no shopping.

Enorme de gordo.

Uma verdadeira caricatura do que tinha sido na adolescência.

Ao seu lado, um garoto dos seus 17 anos.

Aquele da foto do msn!

Voltou para casa e investiu no seu casamento.

O certo é que, se bobear, nos tornamos presas fáceis de leões perigosos que nos rondam virtualmente.

Eles querem nos fazer acreditar que somos os seres mais desejados, belos e sensuais do planeta.

E quem não gosta de ter o ego massageado?

O problema é que tudo isso não passa de uma grande mentira.

A verdade é que somos donos das nossas vidas.

Não precisamos de ninguém escondido atrás de uma máquina, para dizer-nos que somos lindos e desejáveis.

O importante é confiar que, depois de matar um leão por dia, podemos dormir felizes porque somos livres.

Porque não precisamos de ninguém para inflar o nosso ego.

Nós mesmos cuidamos disso.