O Apocalipse Contemporâneo
Vendo o mundo por dentro de uma televisão um tanto quanto modesta, com as suas, digamos, 14 polegadas, senta-se o bom e austero amigo – Não quis colocar o tendo 21 polegadas por vontade minha mesma – conhecido de todos nós, cujo do trabalho acaba de tornar, e sentado por mais uma no sofá, espera no mínimo um repouso que o seja.
Como todo bom brasileiro, liga a televisão e coloca no Jornal.
Então, como que tomado de sobressalto, se vê d’outro lado da tela uma menina caindo da janela, tendo lá seus quatro ou cinco anos, loirinha, branquinha, totalmente bonitinha; e o pior, os próprios pais a jogaram.
E quando ele esperava ver mais uma vitória – na maioria das vezes derrota... – da seleção, aparecem garotas assassinadas por seus namorados, reféns sendo elas, tendo todo o caso a policia assistido inerte; elas, lindas, cabelos lisos, olhos prontos à vida, e de sobressalto, um tiro embaça a televisão, junto a um grito!
Quando ele pensa ter o filme da realidade chegado ao seu fim, aparece-lhe um jornalista alvoroçado, atônito, olhos esbugalhados, lacrimejantes, gritando como se estivesse sendo torturado, para todos ouvirem, O mundo acabou.
Sim, o mundo acabou brada o homem com cara de assombro; e o nosso bom amigo, já também tomando para si o desespero do interlocutor, coloca as mãos por sobre a careca – sim Careca! – esperando a vinda de não se sabe o quê, quem sabe o próprio Cavaleiro do Inferno, e diz o brasileiro para si mesmo, Por que agora meu Deus, minha vida está uma droga, eu sei, mas quem sabe não melhora? E no exato momento destes pensamentos, o jornalista termina a frase dizendo:
- Wall Street ruiu, salvem-se todos!
Mais calmo, o bom amigo careca, respira e fala baixinho para esposa a qual o olha sorrindo:
-Será que essa “crise” chega à nossa rua?
-Mas Raimundo, essa tal “Wall”, não é muito longe daqui?
Responde de semblante investigativo a cansada, gorducha e de dedos roliços, senhora a qual do trabalho acabara de chegar, quase sentada ao seu lado do sofá.