QUINZE DE MARÇO
Levantei várias vezes na madrugada para cumprir os preparativos de uma biópsia de próstata, marcada para as 9 horas da manhã seguinte. São muitos. Mas, antes das oito já estava liberado para sair. “Como ninguém em casa manifestou vontade de me acompanhar, parti em silêncio para a Urológica. Tenso, peguei um ônibus lotação, porque assim pensei que ficaria mais invisível.
Na Clínica fui obrigado a dar uma desculpa pela falta de acompanhante, mas garanti à atendente que minha irmã, que leciona numa escola no primeiro turno, voltaria para me buscar. Ela tomou nota do seu celular e, minutos depois, fui chamado ao ambulatório.
Encontrei um ambiente agradável, tudo muito limpo e todos os equipamentos eletrônicos no seu lugar – coisa de primeiro mundo. Ainda apreensivo, vesti uma camisola verde e, sob o olhar atento de uma enfermeira, deitei na cama hospitalar. Logo, entraram dois médicos: um para retirar os fragmentos do órgão para exames laboratoriais e o anestesista. Ambos cordiais e amistosos. E, com uma boa dose de habilidades, eles me esclareceram como seria o procedimento médico de cada um.
Meia hora depois, acordei com a enfermeira ao meu lado, que me informou que a intervenção tinha ocorrido muito bem. Aliviado, mas ainda meio zonzo, ela me pôs em uma maca e fomos para uma sala de repouso. Lá, mergulhado num silêncio consolador, tomei um frasco de soro e minha pressão medida várias vezes. Depois, fui convidado a saborear um suculento lanche que ajudou a melhorar, em muito, minha disposição.
Pronto para deixar o andar superior da Clínica, outra moça quis saber pela minha acompanhante, dizendo que havia chamado por ela na sala de espera e ninguém atendeu.
- Não tenho – respondi. - Eu mesmo me acompanho.
Ela com ar de surpresa:
- Como assim?
- Isso mesmo. Estamos aqui: eu e eu. Não basta?
- Então, está sozinho, sem acompanhante?
- Sim.
- Meu senhor, isso não deve acontecer. Não leu as recomendações: é indispensável que uma pessoa adulta o acompanhe quando da saída do Hospital.
- Li. Como não pude contar com ninguém, me convidei e aqui estamos.
- Meu senhor, um ou uma acompanhante, além do apoio presencial oferece ao paciente um conforto emocional, um alento, não acha?
- Acho. Desculpe-me, mas na próxima eu prometo que isso não vai acontecer.
Ela fecha o sorriso:
- Espero que não veio dirigindo um carro!...
- Não, neste item obedeci a regra. Como não passa das onze horas da manhã, pretendo pegar um táxi, moro perto.
- Tudo bem – concorda a moça reabrindo o riso - o senhor pode descer e aguardar no hall de entrada da Clínica. Vamos chamar um táxi.
- Ótimo.
- Só mais uma coisinha: em casa, procure seguir as instruções deste folheto. Ok?
Agradeci a moça loira de olhos claros e tomei o elevador. Quando cheguei à portaria uma das recepcionistas levantou os olhos para mim, e disse:
- Senhor, aquele é o táxi que vai deixá-lo em casa com total segurança. Um momento que vou acompanhá-lo até o carro.
- Obrigado por tudo.
- Vá com Deus e que tenha uma boa recuperação. Qualquer desconforto que sentir, volte que será atendido pela nossa equipe de plantão.
Deixei a Clínica com a satisfação de que tudo agora estava bem e que ainda permanecia no mundo para continuar minha história de vida.
• FBN© 2006 * QUINZE DE MARÇO - Categoria: crônica. Autor: Welington Almeida Pinto