Só por um Parente!
Aqueles que amamos são os que nos socorrem nas horas em que mais necessitamos! Esta é uma grande verdade, assim eu penso e tenho vivenciado até hoje, mas também são eles que nos colocam em algumas “roubadas” da vida.
Meu sobrinho comprou uma motocicleta, até aí nada de estranho, foi com o dinheiro dele, trabalhando duro. O problema é que devido à falta de horário livre no trabalho, tivemos alguns problemas. Ainda mais quando não se possui a tal habilitação! Achava que deveria ser feito o contrário, ter uma habilitação antes, para depois comprar a moto, mas sabe como é jovem, não é?
Fui solicitado a levar a moto para o DETRAN, para obter a primeira licença. Tudo bem, eu tenho habilitação, sem problemas... Quem já fez isso sabe que temos poucos dias depois de emitida as notas fiscais, fábrica e agência que efetuou a venda, temos que “correr” para emplacar o veículo. Simplesmente meu sobrinho deixou passar quase dois meses.
Depois de marcar e desmarcar a empreitada, conseguimos achar um dia em que os horários eram compatíveis. Lá fui eu fazer algo que aparentemente é simples, o problema é que para os da “segurança pública” já estávamos ilegais, não podíamos ir com o veículo rodando. Ainda por cima, naquele dia, choveu pela manhã... Acabamos indo lá pelas 14 h.
Parece brincadeira, não tínhamos andado nem uns 3 km de estrada e o carro dos “homens” apareceu no retrovisor. Esperei com calma, achei que eles fossem fazer algum sinal, demonstrando suas intenções, pedindo que eu encostasse, mas não foi necessário, meu sobrinho percebeu a tal presença e ficou nervoso: - Encosta tio, encosta... Estão atrás de nós! - Me senti assim uma espécie de fugitivo. Como já havia percebido pelo retrovisor, eles começaram a piscar os faróis. Encostei com a maior calma, afinal de contas não somos bandidos, tínhamos as notas fiscais, estávamos indo para o DETRAN... Pra min tudo certo. Desliguei a motocicleta, tirei o capacete...
- Boa tarde. A minha parte está em dia - fui passando a habilitação para a autoridade. Verdade é que ninguém fica muito calmo numa hora dessas, acho que é assim com qualquer cidadão comum. Ao ver que meu sobrinho e os “homens” ficaram calados...
- Cara, não fica aí parado, mostra os documentos pro sargento - falei tentando mostrar calma - enquanto meu sobrinho abria a mochila e retirava os papéis, fui me adiantando...
- O Senhor vai ver que está tudo certo, tá tudo pago, primeira licença, tá tudo pago... Estamos levando a moto dele pra emplacar em Araruama, no DETRAN - só eu falava... Foi aí que esperei que meu sobrinho além de mostrar a papelada também mandasse alguma coisa, mostrasse sua carteira da marinha, sei lá... Tomasse conta da situação. Nada disso!
- O menino é da marinha Senhor, tava embarcado, por isso que passou um pouco do prazo de emplacamento, mas estamos resolvendo exatamente isso - Tornei a falar sem nada me perguntarem... Foi aí que a autoridade, me deixando de lado e se dirigindo ao meu sobrinho, falou...
- A moto é sua, não é? - ele balançou a cabeça afirmativamente - Já passou muito tempo, são no máximo uns cinco dias de prazo... Eu podia levar essa moto, apreender ela agora... - O sargento mandou essa... Ficou aquele clima estranho, meu sobrinho não falava nada, mudo... Eu esperando o desenrolar da “dura” que estava tomando... Depois de velho chega a ser mais emocionante essa coisa toda! Já estava olhando a estrada pra ver se tinha algum ponto de ônibus por perto, imaginando ter que caminhar pela beira da estrada, chegando em casa a pé, o patrimônio do sobrinho recolhido ao depósito... Não sei se foi aquela onda de ninguém falar nada, se foi a cara da dupla que eles iriam prejudicar, sei lá... Foi nesse instante que a autoridade foi verificar a minha habilitação, virou de um lado, do outro... Então foi proferida a sentença...
- Vou deixar vocês irem, mas fiquem sabendo que poderia levar essa moto agora, isso tá errado, não pode ficar rodando sem placa – nesse instante eu não estava mais preocupado com a moto, com o ponto de ônibus, com a estrada... Fiquei de olho na minha habilitação que o sargento ainda tinha nas mãos... Sem me dirigir a palavra devolveu... Foi um tremendo alívio!
- Muito obrigado Senhor... Tou levando ela agora pro DETRAN... Pode deixar... - sem ligar absolutamente nada pra min, as autoridades voltaram pro carro e foram embora.
Acreditem o menino não disse uma palavra!
Acalmei meu sobrinho dizendo: - Estatisticamente, não é provável que tenhamos mais problemas desse tipo, pelo menos até chegar lá! - não sei se isso o deixou mais calmo, mas certamente a matemática provou ser capaz de prover algum conforto para os seres normais. Não só os políticos podiam dizer essas coisas, visando um conforto pessoal, ficando “aliviados” de sua carga, enganar os ouvintes e a si próprios. Quem sabe? Estatística é uma maravilha mesmo, né?
Mas a novela não termina assim... O desenrolar dos eventos guardavam mais uma surpresa! Chegando lá...
Já dentro do DETRAN, com tudo encaminhado, na mais perfeita ordem, ninguém se sentindo um “criminoso”... Afinal de contas, quanto vale a palavra de um cidadão brasileiro?
Aqui acho que é cabível dizer que os serviços de emplacamento e renovação de licença, perto do que eram, melhoraram muito, mas muito mesmo. Tá certo... Eles te tomam uma grana mesmo, todo ano, IPVA no Rio é escorchante. Nossa! Eu ainda me lembro dos tempos em que se faziam essas coisas lá na Avenida Francisco Bicalho... Quem aturou aquele lugar lembra, eram experiências inesquecíveis! Faziam de tudo pra você desistir e entregar a documentação nas mãos dos “Zangões”... Melhorou mesmo.
- Faço o que agora tio?
- Agora é esperar imprimir o documento, o verdinho, pegar o lacre vermelho e levar pro cara colocar a placa... Maior moleza... Não falei?
Começou uma agitação atrás do balcão. As meninas iam e vinham... Foi quando soltaram à notícia:
- O problema é geral... O sistema caiu... Um problema com a Telemar. Vamos aguardar até a ordem de protocolar, pra voltar noutro dia. Quem tiver com pressa eu posso protocolar logo – falou a funcionária do DETRAN, meio assim que não querendo encarar os olhares do pessoal que estava esperando, no sol, sem um lugar para sentar.
- Senhora... Senhora... Se não for chatear, posso saber como fica o pessoal que veio pra primeira licença? – Ela deu uma risadinha...
- Vai ter que esperar até voltar o sistema – falou com a maior calma.
- Mas se o sistema não voltar? Hoje é sexta-feira! Já tomei uma dura pra trazer a moto até aqui... Como fico? – ela deu de ombros.
Fiquei até às 16h50min esperando o sistema entrar... Nada!
- Como esse protocolo mesmo diz, ele não garante nada, é só mesmo pra retirar os documentos. A partir de segunda-feira – foi o que tive de ouvir da atendente.
É meu amigo... Espero não ter que contar outra história dessas na próxima etapa. Mas que no rodapé do tal protocolo está escrito um presságio de problemas, isto está mesmo: “ESTE PROTOCOLO NÃO PODE SER UTILIZADO JUNTO A AUTORIDADE POLICIAL COMO COMPROVANTE DE REGULARIZAÇÃO”.
- #$&*ŧδЩٹيٸ... Brasileiro sofre mesmo! – tive que resmungar baixinho – Se tivesse um DETRAN em meu município não tinha que passar esse aperto todo.
Na viagem de volta... Nada aconteceu! Viu como estatística funciona mesmo? Agora tenho que fazer os cálculos da segunda etapa.
A.Luiz Canelhas Jr. – 29/10/2006
lucan258saqua@yahoo.com.br
Saquarema – RJ