A FORMATURA DE JORNALISMO
A FORMATURA
Nelson Marzullo Tangerini
No dia 3 de julho de 1982, a Turma Decenium Primum 1978/1982 (da qual o jornalista que vos escreve fazia parte) colava grau no Auditório do Hotel Intercontinental Rio e dava “mais um sim à vida”, como alertava o convite de formatura, que ainda guardo com muito carinho. A FACHA, Faculdades de Comunicação e Turismo Hélio Alonso, fazia 10 anos de existência (1972/1982).
Um amigo teve a luminosa idéia de convidar Carlos Drummond de Andrade para ser nosso paraninfo. Um outro lhe disse que Tangerini vinha mantendo correspondência com o poeta. Este pediu que eu tentasse convencer Drummond. Pedi que ele mesmo tentasse o contato e passei-lhe o endereço do ilustre itabirano. Não queria que Drummond pensasse que o contato e minha aproximação eram já uma espécie de armadilha.
O poeta era arredio e fugia de solenidades, formaturas, fotógrafos e jornalistas.
João, porteiro do edifício onde Drummond morava, em Copacabana, contou-me, um dia desses, que vários tietes do poeta chegaram a pular a grande para se esconder no jardim. Só para ver o itabirano passar ou pedir-lhe um autógrafo.
Infelizmente, para os fãs, João os descobria e os expulsava, estrangando a festa.
Alguns jornalistas ficavam do outro lado da rua para fotografar Drummond, o que era também muito difícil.
De minha parte, sempre admirei a retidão de Drummond, sua postura humanista e reservada e seu jeito mineiro de ser.
Ouvi histórias de que ele entrava sorrateiramente na redação do Jornal do Brasil, quando ia entregar suas crônicas ou poesias. Fazia tudo para não ser notado.
Mil histórias sobre o poeta circulavam entre nós...
Gentil como sempre, Drummond escreveu-nos estas belíssimas linhas que poderão servir para muitos jornalistas e demais profissionais da mídia - os que não colaram grau conosco e, principalmente, aqueles que nela trabalham de forma leviana:
“Meu bilhete (e não mensagem) aos diplomados de Comunicação:
Só encontro uma explicação para a minha escolha como patrono de vocês: tenho tentado ser, a vida toda, no jornalismo e na literatura, um comunicador.
Sabemos que a comunicação é tão velha quanto o mundo: antes de ser estruturada em ciência e arte, já era uma constante da natureza. Em verdade, ela se identifica integralmente com a vida. Não há vida solitária, no sistema da Terra, que é um sistema de inter-relações.
A missão de vocês, no meu entender, consistirá em tirar do princípio universal da comunicação uma utilidade específica, de benefício social e de afirmação individual. No jornalismo, no rádio, na televisão, na publicidade, nas relações públicas, nas mais variadas formas de atividade profissional, o objetivo é um só: promover o entendimento entre os seres humanos, para a dignificação da vida como projeto de felicidade.
Para isto vocês se prepararam fazendo cursos especializados, que amanhã serão completados pelo confronto prático no mercado de trabalho. Ainda aprenderão muitas coisas, pois a vida é constante experiência, descoberta e também criação e invenção contínua. Desejo que realizem um bom trabalho, com o máximo de lucidez e espírito fraterno, trabalhando por melhorar a existência comum.
A todos, meu profundo agradecimento pela honra com que me distinguiram.
Rio de Janeiro, 30 de maio de 1982
Carlos Drummond de Andrade.”
Nelson Marzullo Tangerini, 53 anos, é escritor, jornalista, poeta, compositor, fotógrafo e professor de Língua Portuguesa e Literatura. É membro do Clube dos Escritores Piracicaba [ clube.escritores@uol.com.br ], onde ocupa a Cadeira 073 – Nestor Tangerini.
nmtangerini@gmail.com, nmtangerini@yahoo.com.br