Eleições lá como cá
ELEIÇÕES LÁ COMO CÁ
(crônica publicada no jornal "Diário Catarinense" de 29.10.2008)
Nos adiantamos a eles e fizemos nossas eleições municipais antes do que as eleições nacionais deles. Mesmo nosso segundo turno - onde cabível - aconteceu quase antes.
Quase antes porque, em diversos estados, em mais de 30 estados, eles usaram um subterfúgio, uma forma de escamotear os fatos, de dificultar a visão clara da realidade, de confundir o observador. Nessa vasta porção do seu território, eles chamaram os eleitores para votar durante as duas semanas que antecedem a data oficial do pleito, a qual passou, assim, automaticamente, a ser a data final para votação.
Com tal expediente, as pessoas puderam programar o dia de entrar na fila - porque lá eleição tem fila mesmo 15 dias antes, o processo não é tão rápido nem tão confiável como aqui (de forma idêntica, as apurações lá não são tão rápidas nem tão confiáveis como as nossas, afora a circunstância muito estranha, para nós, de que o menos votado dos dois candidatos pode ser o presidente eleito democraticamente segundo as leis e a Constituição - deles).
Essa elasticidade no prazo para depositar o voto na urna, enfim, foi o detalhe que fez com que eles, de certa forma, embora numa proporção razoavelmente reduzida, nos precedessem em relação ao segundo turno.
Aliás, a expressão "depositar o voto", que para nós remete a um tempo passado, de costumes ancestrais, lá com eles reflete o ato físico efetivamente exercido pelo eleitor. Imagine-se agora uma incerta quantidade de votos mantidos nas urnas durante duas semanas, aguardando ansiosamente o momento de serem contados... Na úmida Flórida, é um risco severo de deterioração de sufrágios - às vezes, acontece de estragarem-se apenas os votos de um dos candidatos. De qual deles, depende apenas de quem seja o governador do Estado.
A maior diferença entre lá e cá é que eles simplesmente escolhem uma espécie de mandatário mundial, um chefão global, para usarmos um adjetivo de entendimento do mercado globalizado. Só eles é que votam em quem vai mexer com o mundo todo.
O problema - e o medo generalizado - é que, das duas últimas vezes em que foram chamados a se manifestar, eles fizeram uma enorme besteira. Por isso mesmo, talvez, daqui para a frente, o presidente deles não seja mais um sujeito tão importante assim para o planeta.
E não sei, confesso, se isto é bom ou ruim.
(Amilcar Neves é escritor e autor, entre outros, do livro "Da Importância de Criar Mancuspias", crônicas)