Assim seja
O espanhol Luís Buñuel disse certa vez: “Graças a Deus, sou ateu”. Essa suposta contradição o resumia: um homem religioso que não tem fé. Pode soar absurdo, mas há muitos assim. Eles impõem a si uma magia encantatória a que não dão crédito, um Dom Quixote às avessas.
Eu participo dessa Igreja. Não sou Pedro, nem João, nem Paulo, nem ao menos Bento, mas partilho de uma comunhão. Minha Igreja são meus poucos Amigos.
Graças a Eles, eu estou Eles. Sinto-me relutante. Tento exilar-me, mas não deixam. Eles me chamam. Dou prova de minha fé, embora mal saibam que é sem querer. Sigo Suas leis, embora não as reconheça. Vou sempre aos Seus cultos, às Suas reuniões sabatinais, mas nunca apregôo; apenas ouço. E me consideram grande, atencioso, honesto, amigo.
Graças a Eles, sou ateu. Entusiasmadamente ateu.
Ainda bem que tenho como ir. Um trabalho inacabado, um encontro previamente marcado, uma noite mal dormida. Graças ao meu carro, eu sou Deus.
Rezarei por eles em minha casa.