Viver de Escrever? Como assim?

Viver de escrever? Como assim?

Dia desses fui convidado para participar de um ciclo de palestras em uma feira literária organizada pela PUC aqui no Rio de Janeiro.

Durante os debates, ouvi a opinião de gente abalizada, como a crítica literária Beatriz Resende, a poeta e tradutora Olga Savari, além de minha querida amiga e poeta Priscila “Pit” Andrade, entre outros escrevinhadores famosos ou não.

Um dos temas debatidos era como os blogs, sites colaborativos e outros suportes interferiam na produção literária e como está escrevendo a geração de escritores que utiliza a internet como a principal ferramenta de publicação.

Deu-se então, um excitante paradoxo. De um lado, Olga Savari - cultuada e experiente escritora que traduziu obras de Garcia Lorca e Pablo Neruda – que afirmou não possuir telefone celular (ai que inveja...), e muito menos computador. E mais. Mesmo tendo seu nome presente em mais de 10 mil sites na web, nunca havia escrito uma linha sequer para publicação on line. Do outro lado, a jovem e bela Alice Sant’Anna que iniciou sua caminhada poética no mundo virtual e chegou a pouco ao seu primeiro livro – “Dobraduras”, pela Sette Letras – e que afirmou que por muitas vezes se flagra adequando o “tamanho do texto” para publicá-los no mundo virtual.

Em uma das minhas intervenções, afirmei que não era partidário da lapidação de meus rabiscos por conta das características do leitor virtual. De fato prefiro perder a atenção de alguns leitores do que me obrigar a usar uma fita métrica na minha inspiração. Disse ainda que considerava o uso dos suportes (sites de literatura, blogs, redes sociais) apenas como um mecanismo de divulgação.

De fato, seja entre meus colegas de ofício poético ou entre meus clientes de consultoria editorial, não conheço nenhum escritor que não almeje chegar ao livro impresso. Mesmo entre aqueles de reconhecido talento e responsáveis por blogs de grande sucesso, não há um só escritor que prefira manter suas obras unicamente no campo virtual.

Afirmei ali, que mesmo reconhecendo que a internet foi fundamental para a disseminação do meu trabalho, acho que estas paragens virtuais jamais substituirão o desejo dos autores quanto aos livros,

Os debates se seguiram com assuntos diversos, entre eles, uma discussão sobre a existência ou não de uma “vanguarda literária”. Mesmo reconhecendo a importância de movimentos como a “Semana de Arte Moderna de 22” e a “Poesia Concreta”, eu sempre fui reticente aos movimentos vanguardistas na literatura, afinal aquela idéia mítica de “incendiar bibliotecas” e negar tudo o que já havia sido escrito sempre me pareceu uma grande bobagem.

Fiquei a pensar nesse meu intrínseco universo particular de escritor e concordei com a linha de pensamento da crítica literária Beatriz Resende que afirmou não haver no presente, espaço para um outro movimento de Vanguarda. Convenhamos, a atual cena literária é um retrato mais que fiel das inquietações que se derramam sobre as nossas cabeças. Afinal hoje, cada um de nós - escritores, busca de maneira desesperada cumprir essa dificílima tarefa de compreender e viver esse presente, de literatura fragmentada e em que o futurismo definitivamente saiu de moda.

Em meio ao frio e aos meus devaneios quanto aos assuntos discutidos, saí da PUC em direção ao calor de minha casa. Pensei em cada um dos autores presentes ao debate e em suas convicções sobre o ofício de escrever. Em meio a esses delírios, me perguntava se eu era muito diferente de todo mundo ou se eu era apenas mais um.

Nesse momento fui abordado por uma jovem estudante de jornalismo chamada Erika, que se dizia aficionada pelo meu trabalho poético. A conversa transitou por paisagens Drummonianas e Cecilianas e acabamos por sentar num bar da gávea para tomarmos um chopp.

Em determinado momento ela me questionou:

- E fazendo tantas coisas assim, como você ainda arruma tempo para trabalhar?

- Mas este é o meu trabalho. Eu vivo de escrever - respondi prendendo o riso.

- Viver de escrever? Como assim? – indagou incrédula.

- Escrevo meus livros. Escrevo para jornais. Escrevo para agencias de publicidade. Presto consultoria editorial.., enfim escrevo! – respondi quase entediado.

Os olhos de Erika me fitaram em silêncio por um longo tempo.

- Será que a pergunta não seria outra? Acho que você quer saber se eu fiquei rico – provoquei sem dó nem pena.

- Ah, isso eu sei que é impossível. A não ser que você também seja um mago – devolveu.

- Quem sabe Erika? Quem sabe? – divaguei.

- Ah...se for, por favor, me contrate para ser sua funcionária bem remunerada – disse sorrindo.

- Mas contratá-la como o que? Assistente de magia? – perguntei.

- Não, para escrever os releases dos seus livros – respondeu.

- Ué... Você quer viver de escrever? Como assim? – devolvi.