Carta a uma estúpida
Senhora,
Claro que estou surpreso!
Como poderia pensar que me quererias? Sempre, exceto quando eu me forçava a não fazê-lo, observava teu corpo como uma criança que vislumbra a morte do próprio pai, com tristeza, angústia e isolamento.
Sentia-me ajoelhado ao ver-te encostar, por mero acaso, teu braço em mim. Minha boca tinha sabor de sangue ao ver-te os lábios ressecados, pedindo uma gota de saliva. Sentia-me as unhas arrancadas quando te via com outro homem. Espelhava-me nele, pensando ser eu quem te beijava. Nessas horas eu me tinha nojo.
E agora tu me dizes:
— Eu te quero. Era apenas timidez.
Não! Não era timidez. Era sensatez – embora não soubesses, como de costume – e que tu transformaste em grandiosa estupidez. Como me queres? Por que me queres? Por que não ficaste lá, longe de mim? Por que vieste aqui e me falaste isso? Como consegues ser mais estúpida do que o quanto eu já sabia?
Claro que estou surpreso!