A Barata

A Barata

suzabarbi@hotmail.com

Com o calor que fez nesta cidade ontem, saí do trabalho louca por um banho e uma água mineral, de preferência gasosa.

Meu programa era simples: depois de refrescar meu corpo do famigerado calor de 35 graus, que castigou a cidade durante todo o dia, vestiria uma roupa bem fresquinha, jogaria um sofá nas costas e veria o pior programa na televisão.

Descobri que adoro programa ruim.

Quando bate aquele cansaço, aquela vontade de não prestar atenção em coisa alguma, nada melhor que um bom programa ruim.

E isso é facílimo de achar na nossa televisão. Mesmo nos canais pagos. O pacote vai desde reality shows, passando por programas de auditório, indo àqueles comandados por entrevistadoras, normalmente muito louras ou muito morenas.

Tem dias que a escolha fica difícil pelo excesso de opções.

Devidamente acolhida pelo meu sofá, garrafinha de água gasosa na mão, todas as janelas abertas para refrescar o apartamento,aciono o controle remoto.

Uma apresentadora morena anuncia a próxima entrevista com uma ex-prostituta e agora escritora, quando escuto um barulho que me pareceu a asa de algum bicho batendo no lustre.

Cabe aqui um esclarecimento: tenho uma relação pouco amistosa com qualquer tipo de bicho, seja ele quadrúpede, bípede, nadador, voador, arrastador, grande, médio, pequeno.

Esta minha característica, digamos, é elevada a potência da histeria quando o “bicho” ( todas as espécies, para mim, são bichos) é uma barata.

TUDO, menos uma barata!

Do meu confortável sofá olhei petrificada: pela janela da sala tinha entrado voando uma e-nor-me barata!

Saí correndo da sala. Rapidamente alcancei o corredor, atravessei a porta e a fechei, deixando apenas uma fresta de onde vigiaria o vôo daquela coisa.

Pior que uma barata é uma barata voadora e-nor-me desaparecida dentro da sua casa.

Ela pode estar em qualquer lugar, até mesmo dentro de seu armário, sobre o seu travesseiro, em cima de sua xícara de chá.

Portanto, tinha que estar de olho.

Ela voava batendo em tudo: quadros, lustres, parede, mobiles. Mas nada de pousar em nenhum lugar.

Como o apartamento é desinsetizado, pensei que se ela pousasse em algum lugar, logo estaria morta.

Ledo engano...

Ela se equilibrou na borda de um quadro e ficou lá, parada, com aquelas antenas e-nor-mes, vivinha da silva.

- Eu vou processar a empresa que desinsetizou este apartamento, pensei.

Em meio ao meu pavor, lembrei que eu tinha um telefone! Um não. DOIS!

Podia ligar para algum vizinho e pedir para que viesse me socorrer.

Os dois telefones estavam na sala, juntos com a barata!

Incomunicável no corredor, soltava um grito a cada vôo da danada.

Comecei a rezar para que ela saísse pela mesma janela da qual entrou, mas parecia que ela estava adorando o apartamento.

Pensei que a próxima providência que iria tomar quando me visse livre da barata era comprar uma daquelas roupas que as pessoas usam para tratar de abelhas. Quem sabe se toda impermeável eu não teria coragem de enfrentar a dita cuja?

O telefone tocou duas vezes e eu desejei ardentemente que a pessoa que estivesse do outro lado da linha se materializasse naquela sala, pronta para matar o ser intruso.

Mas o pior ainda estava por vir: aquela coisa repelente voou em minha direção e com um barulho HORRÍVEL bateu na porta, atrás de onde estava escondida.

Nem é preciso dizer que meio prédio escutou meu berro e não passou muito tempo, um vizinho tocou a campainha.

Eu suava em bicas só de pensar que aquela coisa estava do outro lado, dividindo a mesma porta comigo. A campainha tocou novamente e escutei a vizinha bater na porta e chamar pelo meu nome. Gritei o mais alto que pude, dizendo que não podia atender mas ela não escutou, porque logo em seguida o telefone tocou novamente e novamente e novamente.

Pronto! A confusão estava armada: a vizinha sabia que meu marido estava viajando, sabia que eu estava em casa porque todas as luzes estavam acesas e tinha escutado meus berros.

Claro que ela devia estar achando estranhíssimo o fato de eu não atender o telefone nem a porta.

Não demorou muito, escutei barulho na porta da frente.

A vizinha tinha chamado um chaveiro e entrava na sala acompanhada de um policial! Provavelmente, aquela era a primeira vez que ele entrava numa casa para...matar uma barata.

Depois de quatro horas de sufoco, agradeci a todos, fechei todas as janelas e fui dormir aliviada no apartamento mais abafado da temporada.

Só abri novamente as janelas quando meu marido voltou de viagem.