BOM OU MAU: LÁ DE CIMA TUDO É IGUAL (Cronicas de uma Quarta sem Graça)
NO ÔNIBUS
O ônibus cheio fede, transpira, sinto falta do meu carro, mas é dia
de rodízio em São Paulo, e utilizo o transporte público para ir
trabalhar; preciso agüentar o aperto, preciso agüentar o cotovelo em
meu rosto, a mochila nas costas do rapaz, que acerta pancada em quem passa, que acerta pancada em que está sentado, toda vez que ele se mexe, e muda a música que ecoa rave de seus ouvidos.
O ônibus é velho, as pessoas são rostos sem face. Se eu pudesse,
tinha vindo caminhando. Se eu pudesse, desceria, mas do que
adiantaria, se o relógio já me diz que estou atrasado e meu chefe não
vai compreender que passei quarenta minutos no ponto, e que o
motorista parou o ônibus por mais cinco, para que o cobrador
comprasse café e jornal. Bebida quente e informação são sempre uma
boa pedida, até ai tudo normal, mas e o relógio com isso? E o meu
compromisso?
Finalmente sento, mas uma senhora aparece e por um momento, juro, só por um momento, pensei em fingir que dormia, mas a consciência é
madrasta, não deixou e a mulher se sentou, sem nem ao menos agradecer o meu gesto, sem nem ao menos se oferecer para segurar meus pertences.
Sigo em pé entre um sujeito fedendo a cigarro e uma mulher gritando
no celular. Uma outra come algo, cujo cheiro chega até as minhas
entranhas; um outro sujeito grita para cada mulher que vê na rua:
pelo visto e pelo sotaque, acabou de chegar à cidade; e é meu
conterrâneo. Quero sair dali, quero respirar, quero sumir, mas ainda
faltam muitas ruas, avenidas e alguns bairros para o fim da minha
jornada.
"O que eu fiz para merecer isso?" pergunto a outro sujeito dormindo,
cuja cabeça bate-bate no vidro, bate-bate na janela; e ele roncando
me responde: "E eu que todo dia passo por isso, meu caro poeta!"
¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*
CATARSE
Leio o jornal do passageiro mais a frente, e novamente, notícias
sobre o crime de Santo André...
Um preto-velho ao meu lado, diz assim, esse algo:
" Outra catarse, outro crime, outra chance de romperem o padrão, de
não sintonizarem com a maldade, de não desejarem o pior para o outro, outra chance de terem mais compaixão...
Outra catarse, outra decepção. Quantas catarses serão necessárias
para moldar o espírito dessa nação?"
¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*
BOM E MAU: LÁ DE CIMA É TUDO IGUAL
Pego o lápis e rabisco algo assim parecido:
" A mesma intensidade tem as ondas do mau e as ondas do bem; pois
tudo é equilíbrio, tudo vai e tudo vem;
Todas as forças trabalham para a construção da nossa manifestação
nessa dimensão;
Todos nós somos vitimas e algozes, pois há diversas vozes ecoando em nossa mente e que se juntam com as ondas da sintonia; por isso é
preciso discernimento e alegria;
É preciso ter compaixão na mente e no coração, principalmente quando
vemos a nossa frente o rosto do outro acusado e o rosto do outro
acusante, pois é nesse instante que colocamos em prática, tudo aquilo
que aprendemos na escola; toda a teoria da sala de aula que não serve para nada, se não usarmos nessa hora;
Caros amigos tenham compaixão pelo seu irmão que cair; pois se
amanhã, de você, algo nefasto também sair, compaixão será o seu
retorno, compaixão terá o seu irmão"
¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*¨*
Que quarta mais sem graça, bendita inspiração!
http://cronicasdofrank.blogspot.com/