O Nó

O Nó

suzabarbi@hotmail.com

Ela fez promessa para Nossa Senhora Desatadora dos Nós assim que soube que seu marido tinha outra.

Subiria as escadas da Igreja da Penha de joelhos se ele largasse dela.

Não podia suportar vê-lo apaixonado por outra.

E ele estava.

Não! Ela não o perderia para qualquer sirigaita.

Era a companheira perfeita.

Até largou a profissão de advogada para se dedicar à família.

E agora, a bomba!

Naquele dia, foi se deitar cheia de esperança, rezando para a Santinha.

A campainha tocou cedo.

Sua amiga queria uma conversa séria com ela: viu ele e a tal almoçando como namorados apaixonados, em pleno shopping!

Ela precisava tomar uma atitude.

Por isso então que o desgraçado não queria mais saber de sua comida!

Chorou até os olhos incharem e exigiu que a amiga fosse com ela ao tal shopping.

Queria conhecer o rosto do inimigo!

E ele apareceu.

De mãos dadas com seu marido.

O monstro usava calça de cós baixo, mostrando uma barriga tal e qual sua mesa de passar roupa – reta e DURA!

Tão estarrecida ficou, que por pouco não atropelou um carrinho com um bebê a bordo.

Pior foi quando olhou para o rosto da...da...

Precisava se encostar em alguma coisa.

A amiga gritou: uma água, URGENTE!

Sussurrando, ela pediu: um uísque triplo!

A inimiga era ma-ra-vi-lho-sa!

E ele lá.

De mãos dadas, exibindo-a como o dono do pedaço.

– Não falei que você não tinha que ver? Que era só tomar uma atitude?

E algo estranho aconteceu: depois do susto (e antes do uísque triplo), ela ficou impassível.

Apenas balbuciou um vamos embora daqui.

Primeira providência que tomou: matriculou-se num curso de inglês e ligou para aquele velho colega de faculdade, presidente de uma rede de escritórios de advocacia.

Segunda etapa: mudou todo o guarda-roupa e o encheu de griffes moderníssimas.

O escorrido cabelo castanho se transformou num ruivo modelito digno da Vogue Coiffeur.

Ele quase infartou quando a viu e perguntou qual o motivo para tanta mudança.

– Nada, amor. O mercado de trabalho exige um pouco mais de produção...

Escolheu a mesma academia de ginástica da peste.

Rapidamente, puxou conversa.

- Desculpe, mas seu personal é bom?

- Sim, maravilhoso.

– Você se importaria de dividi-lo comigo?

– De jeito nenhum. Estava mesmo procurando alguém para correr nos finais de semana.

– Pelo visto não é casada.

– Não. Mas tenho namorado.

– E ele não fica com você nos finais de semana?

– Não. Ele passa com os filhos.

– Ah! Ele é separado?

– Bem. Ainda não. Mas parece que vai pedir o divórcio. Sabe como é, mulher quando percebe que vai ser abandonada vira o diabo.

– A dele virou?

– Não mas vai virar. No mínimo, deve ser uma gorda, sem assunto.

– No mínimo...

As horas-extras viraram cotidiano do casal.

Enquanto ele estudava com as crianças, ela inventava uma petição e saía com a outra para um choppinho rápido, que durava horas.

Percebeu que ele andava irritadiço.

E ela pedia calma. Isso é só no começo. Tenha paciência. Afinal, você sempre foi o melhor marido do mundo...

Colocou as crianças no judô, natação, ginástica olímpica.

Ele assustou.

Ela recorreu: não podemos deixar os meninos fora disso.

– Mas não podia ser mais perto de casa?, ele apelou.

– De forma alguma! Eles têm que freqüentar os mesmos lugares que os colegas...

Nunca podia buscá-los nas novas atividades.

Estava sempre presa no serviço mas tinha certeza que ele podia dar um jeitinho, buscar as crianças e aproveitar para levá-las ao cinema.

Elas iam a-mar!

Enquanto ele assistia Homem Aranha, ela saía com a outra.

– Ele não tem mais tempo pra mim.

– Mas o que está acontecendo?

– A mulher começou a trabalhar.

– Mas todas as mulheres trabalham!

– A dele está jogando os filhos em cima dele.

– Como assim, querida?

– Nem buscar os pestinhas no tantão de cursos que eles fazem, ela pode! Sobra tudo para ele fazer.

– Ah! Mas para quem gosta, sempre sobra um tempinho...

– Você acha que é desculpa dele?

– De jeito nenhum, querida. Qual homem ia querer ficar longe de uma mulher tão interessante como você?

– Ai! Tenho vontade de matá-la! Deve ser uma gorda insuportável.

– Deve. Gorda insuportável...

Hora de atacar os finais de semana.

E viagens começaram a aparecer.

Uma causa aqui, uma ação ali e ela enchia a outra de convites para passarem o final de semana em um hotel fazenda ma-ra-vi-lho-so que conheceu com o marido.

– Quando casar, quero ter o mesmo tipo de relação que você tem com o seu marido. Acho linda essa confiança que existe entre vocês.

– Isso. Confiança...

Hora da cartada final.

A solução era um talentoso advogado, 26 anos,

SOLTEIRINHO DA SILVA E TOTALMENTE DISPONÍVEL!!!

O encontro foi marcado.

Para ele, um drink após o expediente. Para ela, uma saída para conversar fiado.

Ele se encantou com a beleza e charme dela e ela com a inteligência e simpatia dele.

Dias depois, a outra lhe contou: tinha encontrado o homem de sua vida e devia tudo isso a ela!

– Mas não fiz absolutamente nada, querida. Foi o destino...

– Ele é maravilhoso e não tem filhos!

– Que bom, querida. E então, você já terminou com o outro?

– Claro! Hoje mesmo conversamos e eu falei que não queria mais ser a outra.

– Que bom, querida. Você tão feliz!

Chegou em casa, ele estava triste e bêbado.

Triste e bêbado por uma, triste e bêbado por duas.

Passou-lhe três folhas de papel.

– Pode assinar este documento para mim?

– O que é isso?

– Nosso divórcio.

Subiu a escadaria da Igreja da Penha de joelhos.

Nossa Senhora Desatadora dos Nós tinha acabado de realizar mais uma graça: desatou o nó da sua inteligência.