NAS MASMORRAS DO SONHO

A praça é do povo, como o céu é do condor. Sempre em mim esta lembrança do verso de Castro Alves, mas já não tenho voz e o povo, bem...o povo se aglomera todos os dias, nos horários de pico e fora dele, na Praça da Sé, no Vale do Anhangabaú, nos pontos de ônibus sem fim desta cidade sem fim, nos vagões do metrô...sempre com a pressa enorme de chegar ao trabalho e de voltar para casa e a casa é cada vez mais longe, quase inacessível e tudo continua como sempre, as palavras prostituídas a se repetirem no horário político onde OS MESMOS repetem à náusea, O MESMO, neste Vale de Lágrimas onde grande parte de nós perdeu a voz, a vez, o verbo, a esperança (tenho a sensação nítida, neste momento, de estar plagiando, neste último trecho, a fala ou a escrita de alguém. Se é este o caso, perdoa-me, Alguém.Afianço que não há dolo nesta minha possível culpa).

Você vem, Ana, alter ego meu, trazendo pela mão a Eugênia do Poeta para que esta diga ao seu profeta que talvez nem tudo esteja perdido e que é sempre possível e preciso olhar as estrelas que nunca se apagam e os lírios do campo,como o Senhor nos exortou e como Olívia, a do Érico, o Veríssimo, disse a Eugênio, seu amor. Eugênia, a de Antonio, a amar pela derradeira vez, sob a luz do amor antigo, o seu poeta aleijado de corpo e de sonho; Eugênio, de Olívia, peregrina pelos hospitais públicos e se debruça diante das camas dos milhões de doentes também públicos, a morrerem com as vísceras expostas, como tantos de nós nas masmorras do sonho inpossível.