SAUDADES

As coisas boas, mais notadamente as mais belas, marcam nossa vida, indelevelmente. De repente, damos pela sua ausência, sentimos sua falta e, às vezes, não conseguimos mais reavê-las. Sim, pois fazem parte de nosso passado, tornam-se parte de nosso eu.

Como disse Cecília Meireles, "eu não dei por esta mudança / tão simples, tão certa, tão fácil. / - Em que espelho ficou perdida a minha face?". As coisas vêm e vão, vão e vêm, mas sua lembrança, vez por outra, permanece.

Quem nos rouba tudo isso? Muitas vezes, o tempo, marcador implacável, que nos persegue a cada passo, a cada instante. Como em Retrato, de Cecília. Aí, bem a exemplo do Barroco, só nos resta o "carpe diem".

Porém, outras vezes, e não raras, são fruto de ingerências, de pessoas que, inapelavelmente, nos roubam aquilo que nos é de mais importante: a nossa alegria, o nosso prazer, o nosso deleite. Algo tão pessoal, que nunca poderia ser-nos retirado.

Não podemos permitir, por menor que seja a nossa perda, que nos retirem, forçadamente, qualquer coisa. Como disse Eduardo Alves da Costa, em seu célebre poema-panfleto (expressão minha), "Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada,". Eu ousaria alterar, dizendo, "E, porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada."

Refiro-me à falta que me faz, incentivado pelo artigo publicado recentemente na revista Época, "Eu quero decidir", de Adriano Silva, as propagandas de cigarro. O governo, há tempo, proibiu a veiculação das mesmas, alegando proteção à sociedade. E quem disse que eu quero proteção? E quem outorgou ao Presidente da República o direito - ou dever, sei lá - de ser meu protetor?

O que sei é que as propagandas eram belíssimas, lindas imagens e que me fazem falta. Não creio que propagandas levem alguém ao vício. E, se sim, há muitas outras coisas que "também" o fazem e não foram proibidas.

Sinto falta das propagandas; nunca fumei, apesar de admirá-las. E, se é pra combater o mal, por que não proibir as falsas mensagens veiculadas no horário político obrigatório?

Deixem-me decidir aquilo a que quero ou não assistir. Creio na minha capacidade de discernir e confio muito mais nesta minha capacidade, em minha inteligência, que na prepotência e ousadia deste Presidente.

Pabinha
Enviado por Pabinha em 21/10/2008
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