E por falar das espirradeiras.

Então essa é a espirradeira, e eu não sabia que era tão venenosa. Sabia que algumas pessoas espirram muito na proximidade dela, daí o nome. E deve haver também pessoas mais e menos sensíveis a ela. Talvez a etiologia deva revelar que seja uma planta com substâncias alergógenas e não venenosas. Mas isso deve ser bem analisado e discutido pelo leitor com o seu médico, que o que aqui relato são só vivências minhas, e não sou médico.

Na minha casa, no tempo da infância, tínhamos dois pés bem grandes de espirradeiras. Davam flores cor-de-rosa, folhas lanceoladas, as hastes retas com medula mole formando forquilhas bem simétricas. A seiva é branca, leitosa, relativamente viscosa. A camada exterior das hastes é mole, facilmente destacável da parte interior lenhosa, permitindo cortar e desenhar com canivete o nome da menina mais bonita da rua, e era Chimbica, oh! loirinha linda, cabelos eriçados - ou fazer desenhos no estilo da cerâmica marajoara. Ficavam bonitas essas impressões. Descascávamos a madeira toda depois de passá-la pelo fogo, e aparecia enegrecida a parte que antes tinha sido descascada no canivete.

Pois é, coisas de menino. Era um arbusto bastante útil para nossas traquinagens. Boas forquilhas para estilingues, hastes sem a medula dando bons canudos para bolas de sabão ou servindo como guias para atiradeiras de arames (a haste furada, uma borracha de câmara de ar de bicicleta, formando uma alça elástica, um arame reto e rígido servindo como flecha). Da resina, boas armadilhas para apanhar insetos.

Bom, pelo que se vê, o meu contato com as tais espirradeiras foi bastante intenso. Contato de pele, boca, mãos, barriga (a forquilha dos estilingues ia colada ao corpo, presa entre a barriga e o elástico do short). A seiva deixava as mãos grudentas. O gosto dos tais canudos para bolas de sabão era ruím, principalmente quando as hastes ainda não estavam bem secas.

Tudo isso que escrevi foi por saudade e por isso me alonguei.

E como dizem que meninos têm bons anjos da guarda, deve ser por isso que ainda estou vivo para escrever essas linhas e nunca tive nada.

Lembrei-me também de um email que circulou pela Net falando das nossas infâncias e adolescências não tão super-protegidas e da pouca assepsia. Do milagre ou absurdo por termos sobrevivido apesar dos banhos de chuva, do brincar na lama nas enxurradas, do chupar melancia quente depois do futebol, e a manga com leite, e o picolé com água não se sabe de onde, do embrenhar-se pelos matos e curar ferimentos com cuspe, das guerras de estilingue, do chupar os cortes para cessar os sangramentos, e mais tarde, na adolescência, da trepadinha na zona sem camisinha ( e tome tetrex), dos mergulhos nos riachos, nas lagoas e rios. Os animais domésticos não eram vacinados, rs.

Pois bem, se passar mais um desses emails por cá, vou complementá-lo dizendo que sobrevivi também às espirradeiras.