5 SEXO PELO FIO

Fazer sexo mental, via fio telefônico, já foi coqueluche. Pegou na onda, virou moda. Entre alguns suaves e escorregadios "huuuns" e "aaais", a vidinha safada das nossas famílias se desenvolvia nas cidades maiores e avançadas.

Ah, mas que nada, a coisa se dava até nas localidades menores: vilarejos, chácaras, sítios, fazendas. E pois não é que Fortaleza também entrou nessa maré? Chafurdagens pequenas da vivência urbana, coisas modernosas.

As contas da privatizada Teleceará engordam como o Faustão e o Jô Soares. Postos em sossego, como diria Camões, dormitando na ceia da ociosidade, "coroas" e bruguelos desavergonhados, homens e mulheres, todos batiam seu ponto na conversa de nhennhenhém do telenamoro. Nem sei bem se era este o nome ou se era telemasturbação.

Uma feita, vi na tevê encrenca feia, com a mediação do Decon. Uma reunião para se chegar a bom termo. Graves membros da Pastoral da Infância e da Adolescência, representando a ilibada e conservadora família cearense, tiriricas da vida. Estavam fumando numa quenga de coco, cobravam decoro das competentes autoridades e que a "utilidade pública" das empresas de telefonia se fossem do ar.

Um depufede insosso e desenxavido, paragovernista, metidiço como sempre, emitiu parecer de dono dos Direitos Humanos. E, ainda, por cima, de lambugem, faço leitura dos rostos asquerosos e desavergonhados dos mercadores do negócio, o sexo pelo fiozinho, sem se ter que pegar AIDS.

Vi na televisão a lengalenga, a discussão verbosa, a partir da qual, falsa moral à parte, tudo já podia tombar ali mesmo no birô do Decon, ou sei lá se ainda leva este nome. Agora tem nome novo, é? Aff!, me ajudem a decifrar, que me engancho todo no cipoal das siglas.

Demanda fácil: era somente botar os camelôs da venda pelo fio para cuidarem de outra lavoura. Regar mudas de abacaxi, ou, então, vendar uvas boas, por exemplo.

Não terá sido daquela que a "coisa" ia acabar. Também da próxima vez o fim do "serviço" pelo telefone, que atendia pelo simpático 0800, não prometeu acontecer, a menos que voltássemos a ser "atrasados" e cafonérrimos. Essa filantrópica "prestação de serviço" ainda não iria parar por ali, porque era fonte de renda, renda encardida e safada, para enfunar os cofres do capitalismo externo e da marginália tupiniquim.

A mãe de um garoto usuário não se continha na sua danação. Eu vi a cara da madama na tevê. A mulher refletia em voz alta, pê da vida, por cobras e lagartos. Disse que o filho estava para ser reprovado na escola, pois só vivia capiongo, indo do pé do telefone para o trono do banheiro. E o montante de cifras do vil metal, que tinha vindo no último boleto do mês?

Vai e vem, nesta agonia, e coisa e tal, a conta da companhia telefônica estava estourada. Uma grana alta e roxa na papeleta da dívida. O menino, contudo, foi franco. Indo bater no inquérito policial-militar do interrogatório doméstico, feito lá pela aflita senhora-mamãe, confessara a pura verdade. Aliás, que não era crime algum: ele era mesmo o usuário pródigo do aparelho e vinha se onanizando a valer.

Se valia ou não a pena essa arrumação do "boy", sei lá!... Mas constato a lição, que é insofismável: sexo pelo fio saía como coisa cara e, sem falsa moral, o que fazia mesmo era tornar a vidinha boba e citadina da pequena burguesia cada vez mais sem vergonha e... modernosa.

Fort., 17/10/2008

Gomes da Silveira
Enviado por Gomes da Silveira em 17/10/2008
Reeditado em 02/03/2010
Código do texto: T1232842
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