"Eu sou sucesso"

Por mim passou o Brasil e um brasileiro disse ”eu sou sucesso”. Havia financiado, em 30 anos, uma casa sem muro, sem alicerce, no Maribondo ou Santa Maria.

Depois de foscos lampejos de consciência aguda, lá vinha, rebolativo, outro brasileiro e disse “eu também sou sucesso”. Havia comprado, em 80 meses, um carrinho em bom estado, com IPVA grátis.

Depois passou um do Sul de mãos dadas com uma do Norte, em vestes novas, e disse-me quase a mesma coisa: “nóis é sucesso” Haviam comprado as domingueiras num “shópis, em Piracicaba, em 3 vez, no cartão”.

Veio a fila dos “só me falta-me o gramur”.

Foi a gota d’água às minhas belas letras. Antes que se me estourasse o coração ou me levassem ao manicômio, fui à ponte nova, a “crescer com justiça e paz”, contei três, dois, um, e atirei-me às águas putrefáctas do esgotão paulistano.

Morto, rolando sobre a lama, rumo à Curva do Japonês, concluí, tardiamente, que no fundo eu nem ligava. A lua tão forte cheia mostrava-se-me através do caudaloso e opaco rio Tietê.

Avassalou-me o desejo de cantar e estraçalhar todo coração odisseu. Mas, o que se canta quando se estar morto, bolando entre água suja e lama podre, a empacar numa paragem?

Matutei, matutei e nada. Flutuava leve, lixava e assoprava as unhas, e, de repente, ocorreu-me o amor bandido de Capetão, o bruto. Cantarolei, então: “No peito enganos mil, na terra é pleno abril...”, outubro; abril é só pra rimar. rsrs