Pensava escrever sobre um bem-te-vi. Lembrei-me da foto de alguns dias atrás. Um clic inédito feito por quem estava comigo, naquele dia, celebrando um grande dia. Na foto, o registro era de um beija-flor. E não de um bem-te-vi. Mas desde criança, acho que os bem-te-vis são parentes dos beija-flores... E ambos, pura poesia... Lembrava-me da foto, e da vontade de eternizar, também em palavras, esse pássaro que mais parece uma poesia dançante (o beija-flor) e o que mais parece uma poesia musical (o bem-te-vi).
 
Os beija-flores, assim como os bem-te-vis devem ter sido criados num momento de extremo lirismo do Divino. O bem-te-vi, num momento em que Deus pensava em espalhar pelo Seu Paraíso, bons presságios e fluidos positivos. “Bem-te-vi” – diria o ser acabado de sair das mãos do Criador. E aos ouvidos de quem por ali estivesse passando, aquilo soaria como uma saudação do próprio Deus. Quer coisa mais linda do que ser saudado por um presente Divino? O som do bem-te-vi, para mim, é algo assim... como o “ estou feliz por tê-la criado”, “estou satisfeito por sua existência”... ou ainda  “estou olhando por você”...
 
Já o beija-flor, penso que foi criado num momento em que Deus ansiava por colorir o céu, mas de forma que não ofuscasse o azul infinito e, sim, enriquecesse aquilo que cobriria o perfeito retrato do mundo. Por isso criou seres leves, quase transparentes como as borboletas. Os beija-flores, se não possuem asas como as de marcas d’água das borboletas, têm as asas a bater tão rapidamente que sua passagem pelo céu é, muitas vezes, imperceptível. Quase como uma estrela cadente. Quando pensamos que os vimos, não há tempo de registrar. São mais rápidos que nosso piscar de olhos. O que dirá de um registro fotográfico.Por isso a importância daquele clic feito por quem estava comigo, naquele dia, celebrando um grande dia...
 
E hoje, exatamente hoje, pensava eu em eternizar em palavras esse pássaro que mais parece uma poesia dançante (o beija-flor) e o que mais parece uma poesia musical (o bem-te-vi).
 
E eis que me deparo, há poucos instantes, com a poesia de Cecília Meireles. Escolha seu sonho – anunciava a capa do livro que tenho há uns dois ou três anos (e que já perdi as contas de quantas vezes o li). E numa das páginas, lá estava um registro feito pela poeta: História de bem-te-vi. Uma crônica que tentava registrar os bem-te-vis de seu momento. E nesse registro, a poeta falava sobre as mudanças do cantar e do desaparecimento desses pequenos seres em função do “progresso”... Ao ler sobre os bem-te-vis de Cecília, lembrei-me de "meu" beija-flor...
 
Cecília eternizava, naquele momento, numa fotografia em palavras, a poesia musical dos bem-te-vis. E eu, com o livro nas mãos, lembrava-me da poesia dançante do beija-flor...
 
Pois, de repente... do silêncio do meu quarto, ainda com a imagem do meu beija-flor e as palavras de Cecília na minha mente, eis que acabo de ouvir um som de bem-te-vi. Seria loucura dos meus ouvidos?  Não sei... Só sei que, aos meus ouvidos, ele apareceu. O fato é que eu o ouvi. E por um instante, a imagem de minha poesia dançante, uniu-se à poesia musical da poeta...
 
E nesse “ouvir e ver”, não quero pensar em explicações objetivas... prefiro pensar que foi um presente Divino, talvez encomendado pela poeta que, lá de seu momento, ajudou-me, com seu bem-te-vi, a eternizar o meu beija-flor...

Que bom presságio. Hoje eu bem-te-ouvi um beija-flor...
 

(Adriana Luz – 02 de outubro de 2008)

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Adriana Luz
Enviado por Adriana Luz em 02/10/2008
Reeditado em 02/10/2008
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