QUE OS ANJOS TOQUEM AS TROMBETAS

Barbaridade! Já não sei como caminha a humanidade, mas se for da forma estranha como anda caminhando por aqui, que os anjos toquem as trombetas anunciando o apocalipse.

Confesso, que tinha reservado para esta nossa conversa um tema ligado a esperança que deveríamos ter diante de qualquer situação que se apresente. Para ilustrar o que me propunha dizer, tencionava transcrever uma das falas de Calímaco, personagem da comédia de Maquiavel, intitulada “ A Mandrágora”, que diz o seguinte: “ Não há situação tão desesperadora que não tenha um caminho aberto para nele depositarmos esperança; e ainda que esta seja débil e vã, a vontade e o desejo que fazem o homem levar sua causa até o fim o deixam ver os obstáculos”.

Mas de repente, senti o quanto seriam inúteis as minhas palavras, pois nem eu própria acreditava nelas. A sensação que tive era de estar num velório tentando consolar uma mãe desesperada que perdeu de forma trágica o único filho, dizendo simplesmente: não chore.

Explico o que me levou a mudar o rumo da conversa: a enxurrada de noticias que me foi jogada na cara logo cedo e diante do quadro dantesco que me foi apresentado, onde buscar palavras de esperança num mundo em que revivendo os tempos de Herodes matam-se crianças indefesas pelo simples prazer de matar. Onde buscar palavras de esperança diante do martírio dos nossos velhos aposentados, que feito os primeiros cristãos perseguidos, enfileirados, caminham com seus passos lentos para a arena em que se transformou a porta de um banco qualquer, onde muitos deles sucumbem devorados pela voracidade não de um leão, mas sim, pela insensibilidade de homens animalescos, condutores de um sistema desvinculado dos direitos que teimam em desconhecer, do respeito e da consideração que a esses senhores são devidos.

Onde buscar palavras de esperanças, se os que se arvoram de senhores dos nossos destinos nos roubaram esse sentimento?

E cá estamos nós, jogados nesta apatia, sem a mínima vontade de um ato de protesto, mesmo por que já não sabemos como nos posicionar diante dos nossos reclamos, uma vez que, se alguém pede a verdade, é taxado de dono dela; se alguém parte em defesa dos menos favorecidos, é taxado de demagogo; se alguém cobra virtudes, é taxado de mistificador.

Então indago: teria razão o advogado Miguel Reale Junior, quando certa vez proclamou aos quatro cantos: “ Hoje estamos descrentes do Brasil, descrentes de nossos esforços pessoais. E, assim, sente-se que aqui não se vive. Falta crença”.

Sem esperança, sem crença e assaltada por uma dúvida cruel de não saber como agir a cada nova situação a que me deparo, com pessoas, animais, coisas etcetra e tal, fico por aqui, um tanto irada, aguardando o som das trombetas.

Zélia Maria Freire
Enviado por Zélia Maria Freire em 02/10/2008
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