Diogo Mainardi é a minha paca do sertão
Ele odeia tomar banho. Sobrevive protegido pelos policiais da gurita. Na praça, durante o dia, perambula entre bancas de revista, olhando manchetes repetitivas de violência nos jornais. Nunca ofendeu a um ser vivo, apenas a si mesmo. Pelo semblante e maneira de ser, ganhou apelido sugestivo: Já Morreu!
Outro dia o encontrei olhando foto de Digo Mainardi na revista Veja.
- Já morreu, vamos fazer uma roça? – Brinco enquanto me preparo para um café-da-manhã no camelodrómo.
É começo de mês. Enquanto sorvo cafeína, observo o “defunto-vivo” na sua contemplação. Do outro lado da rua, fila no caixa-rapido da financeira: pagamento do programa bolsa-família. Não vejo muita diferença entre Já Morreu e alguns sedentários da fila que passaram a reinar nas periferias das cidades brasileiras às custa de doações do governo.
Já Morreu é autêntico, assumiu posição de ostracismo permanente - até com seu bem-estar físico -, e jura que trabalha; profissão: Preguiçoso assumido desde que nasceu! Já os novos sedentários deixaram de trabalhar e se contentam com um ativo final de semana nos botecos das periferias. No restante do mês, vivem nas esquinas - muitas vezes falando mal do prato em que comeram -, ou vão para o mato caçar paca para tira-gosto de pinga.
- Já Morreu, vai ou não vai fazer uma roça comigo...? – Uma olhada de soslaio e um pedaço de pão mastigando minha paciência.
Já Morreu – na sua vida miserável -, sorri da foto de Mainardi. Mainardi não conhece a vida de Já Morreu; nem de semelhantes. O máximo que já pensou sentir das dores sertanejas está em seu livro “Polígono das Secas”, onde questiona mitos sertanejos e literatura brasileira deste contexto; já da vida de Veneza, na Itália, esse é um expert.
Diante das críticas desse colunista e relevando criação do atual governo de uma nova classe social no Brasil - Os sedentários -, o retorno da nossa soberania nacional frente à “religião das multinacionais”, juntamente com avanço no crescimento econômico, já é motivo de sobra para um banho no preconceito da medíocre sociedade classe média e alta brasileira – onde se inclui Mainardi. O anti-lulismo mostrou que é mais do que viva a discrimição aos nordestinos, aos pobres, aos que não tem acesso ao ensino, as mulheres... O que bem demonstra a crítica cômoda, cáustica e evasiva do colunista.
Depois de enfadar-se de escrever sobre cultura, resolveu ser caçador de Lula; a caça tornando-se caçador. Concluindo: não dá para dar crédito a quem fala mal de esgoto se nunca lá viveu. Mainardi é como paca do sertão, caçada pelos sedentários: na falta do que fazer, passa o dia no conforto da toca e serve de tira-gosto ao ostracismo político midiático.
- Já Morreu, vamos pelo menos tomar banho...?
Deixei moeda do café sobre a mesa castigada de afazeres e contemplei minha sujeira da noite passada: Sujo sim, asqueroso não... Se existe alguma pessoa asquerosa neste país, ela não é de esquerda!
- Já Morreu, tu parece que é “paca”....!
Uma desmunhecada e um rebolado desengonçado:
- Ra, ra, ra, ra, ra..... Até em Veneza, Filho!
c/cópia para o articulista Diogo Mainardi