E viva o Bruxo!
As palavras têm sexo(...)
Amam-se umas às outras. E casam-se.
O casamento delas é o que chamamos estilo.
Machado de Assis
Nos últimos dias, tenho procurado ler tudo o que a imprensa vem publicando sobre Machado de Assis. E quando Deus me dá tempo, retorno às suas crônicas, seus poemas, contos e romances.
Lendo-o, lendo-o, lendo-o... é como posso participar das comemorações alusivas ao centenário de sua morte.
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Neste momento, tenho diante de mim Memórias Póstumas de Machado de Assis, livro do saudoso romancista Josué Montello.
Em 750 páginas o imortal maranhense oferece aos brasileiros a oportunidade de melhor conhecer boa parte da obra do Bruxo do Cosme Velho, nascido no dia 21 de janeiro de 1839, num morro carioca.
Vale a pena esmiuçar-lhe as páginas, mas sem aquela preocupação de chegar logo ao fim.
Como um apaixonado pela crônica, e, conseqüentemente um admirador de quem a escreve com perfeição, no livro do Montello, detive-me no capítulo em que ele mostra Machado de Assis, o cronista.
Com que simplicidade o Bruxo deitava no papel seus pensamentos, suas opiniões! W deixou para a posteridade a idéia de que a crônica, quanto mais simples, mais bonita, mais atraente, mais aceita.
Montello transcreve várias crônicas do criador de Capitu, sempre preocupado em escolher as melhores.
Transcrevo, em seguida, uma delas. Observem como Machado tira de uma palavra - a botica - um texto simples e brinda seus leitores com uma crônica eloqüente; boa de se ler.
"Fidelidade à botica
Criei-me na veneração da farmácia. Entre parêntesis, e para responder a um dos meus leitores de Ouro Preto, se escrevo botica, às vezes, é por um costume da infância: ninguém falava então de outra maneira; os próprios farmacêuticos anunciavam-se assim, e a legislação chamava-os boticários, se me não engano.
Botica vinha de longe, e propriamente não ofendia a ninguém. Anos depois, entrou a aparecer farmácia, e pouco a pouco foi tomando conta do terreno, até que de todo substituiu o primeiro nome. Eu assisti à queda de um e a ascensão do outro.
Os que nasceram posteriormente, acostumados a ouvir farmácia, chegam a não entender o soneto de Tolentino: Numa escura botica encantoados, etc., mas é assim com o resto; as palavras aposentam-se. Algumas ainda têm o magro ordenado, sem gratificações, que lhes possam dar eruditos; outras caem na miséria e morrem de fome." - 26.1.1896.
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Basta que amanhã - 29 de setembro - cada cronista escreva duas linhas sobre Machado de Assis.
Será o suficiente para manter viva a memória do nosso maior romancista, nem sempre devidamente lembrado.
Nota - MA morreu no dia 29-9-1908, em sua casa, na Rua Cosme Velho, 18 - Rio de Janeiro