Ô VIDA LOUCA!
Ontem fui dormir no céu e acordei num bruto de um inferno. E cá estou, tentando identificar o diabinho que me puxou pelo pé e me jogou nesse caldeirão que por direito lhe pertence e eu não posso bem dizer como entrei.
Mas, como tudo tem a sua razão de ser, acabo de descobrir o porquê do gosto amargo na boca, da sensação de desconforto, da vontade de falar com as paredes. É que antes de adormecer, por conta da mania que tenho de ler alguma coisa, a leitura foi “A Divina Comédia, de Dante e noite adentro passei pelo Céu e Purgatório , para ver raiar o amanhã no maldito do Inferno. E dele, assim Dante inicia o seu relato:
No meio do caminho da nossa vida
Encontrei-me numa selva escura,
Porque me tinha extraviado da via do bem
Ah, quanto é árduo e doloroso dizer qual era
esta selva selvagem, áspera e infranqueável
da qual só a lembrança me renova o terror!
(...)
Era o momento em que a manhã se levanta,
E o Sol subia com as estrelas,
Que o acompanham, quando o Amor divino
Criou primeiro estas coisas belas;
De modo que esta hora do dia e a doce
estação fizeram-me conceder toda a esperança
(...)
Eis que quase ao começar a subida.
Apareceu uma pantera ágil,
Que de pêlo manchado era coberta;
Ela não se me afastava dos olhos:
Pelo contrário, impedia-me muito o caminho,
Que, por várias vezes, estive para voltar para trás.
(...)
Esta me atemorizou tanto, com o horror que
Provinha do seu aspecto, que eu perdi a esperança
De atingir o alto da colina que me dispunha a subir
E como aquele que com muito gosto ganha
Quando chega o tempo que o faz perder,
Sem descanso chora e se entristece
Ai nessa parte acho que dei um conchilo, para despertar com essa sensação de que o inferno é aqui e agora.