Crônica do eleitor feliz
Quando era criança, o eleitor acompanhava seus pais em dia de eleições. Ia com eles à seção eleitoral e parecia maravilhoso o “dia de votar”. As filas, as pessoas com a camiseta de seu candidato, a agitação, a conversa entre quem nem se conhecia. Finalmente ele via porque em sua casa havia tanta expectativa quanto a esse momento.
Enquanto ia no ônibus até aos locais de votação dos pais, porque não votavam no mesmo local, e assim o garoto vivia duas vezes, na mesma data, a mesma festa, e no ônibus, nas ruas, ele via os panfletos no chão, com fotos coloridas que ele achava lindos. As pessoas carregavam e sacudiam bandeiras, ele também recolhia algumas do chão e começava a sacudir. Mas mal principiada a diversão sua mão já dizia: “Larga isso, olha a Polícia”.
Finalmente chegava o momento. É hora de votar! E lá se ia o pequeno eleitor para a cabine com seu pai de manhã e com a mãe à tarde. Atrás daquela “paredezinha” ele via o quanto é bom ser adulto. Às vezes insistia tanto que o deixavam marcar o “x” na cédula. Estava realizado. E se houvesse segundo turno, festa novamente. O clima eleitoreiro fazia dele um futuro eleitor feliz.
Tempos depois ele completava 16 anos e era ano de eleição. Fez seu título e votaria na mesma seção que sua mãe. Pela primeira vez iria sozinho à cabine, registrar sua escolha e participar da História do país. Foi orgulhoso para casa, e o melhor é que haveria segundo turno. Pela primeira vez ajudou a eleger um presidente. Aí ele sentiu o peso de sua participação, e amargou, mais adiante, ao ver as esperanças de melhora que tinha, realmente não passarem de ilusões. Aprendeu o que é denúncia, investigação, CPI, cassação, uma porção de nomes, nenhum progresso. Outra vez o eleitor foi à urna.
Com18 anos votou para eleger um prefeito. Nessa vez, com urna eletrônica. Prestou atenção às propostas dos candidatos a vereador que poderiam fazer boas coisas por seu bairro. Decidiu-se pelo candidato a prefeito que parecia prestativo e inovador.
Após a posse, viu que nada mudava. O discurso continuava bonito, mas as atitudes não honravam as falas da campanha. E anos se passaram e novas eleições foram realizadas. Houveram algumas poucas melhoras, mas todas visavam garantiam de reeleição. E toda vez que o eleitor volta para casa, olha para o terreno em que alguns disseram que fariam uma quadra de esportes, ou um posto de saúde e vê ali apenas ervas daninhas crescendo.
Às vezes ele conversa com seus pais e fala de política. Assistem juntos ao horário eleitoral. Observam os candidatos; riem de uns, não entendem a hipocrisia de outros. Hoje é com tristeza que o eleitor já homem feito, trabalhador, universitário vai às urnas, ele até já foi mesário. Junto com seus colegas, reúne-se na casa de algum para estudar ou apenas conversar após irem todos cumprir o dever de cidadãos, enquanto esperam que se divulgue o resultado.
Coincidentemente todos esses amigos têm boas lembranças de quando eram, garotos e acompanhavam seus pais durante a votação. Naquela época, dia de eleição era mesmo dia festa, era até feriado, não tinha aula. Agora, é dia de ansiedade e descrença. Ansiedade por saber o eleito, descrença porque o pequeno eleitor cresceu e entendeu o significado do Regime Democrático que rege o país. E tendo entendido o Regime, fica triste, por ver a inocência de muitas pessoas que não sabem que sua escolha, o seu voto, não é moeda de troca, mas sim o primeiro dos direitos que promovem o bom andamento da Democracia.