Cartas de Salamanca - MPB NA ESPANHA
O baiano Carlinhos Brown é, certamente, o nome brasileiro mais escutado e difundido atualmente por aqui. Em Salamanca ele ainda não esteve, mas, pela imprensa, sempre acompanho o enorme sucesso que ele faz, arrastando muito gente com seu trio elétrico, cada vez que se apresenta em Madri, Barcelona e em outros lugares. O público jovem o conhece e as rádios tocam seus sucessos.
Conversando com o amigo Paco Pandura – que é, confessadamente, “ um aficionado” pela música brasileira –, pergunto-lhe se ele lembra de outro brasileiro que fez sucesso análogo por estas bandas. Roberto Carlos, responde ele. Acrescenta que especificamente nas décadas de setenta e oitenta, o nosso “rei” gravou em castelhano e conquistou considerável fatia do mercado espanhol. Ainda hoje continua sendo ouvido, mas, em menor escala. Outro dia, eu estava na fila do caixa do Carrefour e logo identifiquei no som-ambiente do supermercado aquela familiar e inconfundível voz anazalada cantando “Mi querido, mi viejo, mi amigo”.
Também observo que a “bossa nova” despertar grande interesse por estas terras de Cervantes. Notadamente por um público mais especifico. Agora mesmo, por ocasião dos 50 anos do surgimento da bossa nova, vejo que em varias cidades acontecem seminários, shows e outros eventos em alusão a data. E, diga-se de passagem, ao entrarmos em lojas do segmento musical, não temos maiores dificuldades de nos deparamos com Cds de João Gilberto e de outros tantos ícones.
Hugo Cesar, doutorando em direito constitucional, com quem também costumo conversar sobre música, diz que tanto aqui como em outros países europeus, em termos de MPB, ele chega a encontrar algumas gravações que em nosso país são “raridades”. E ressalta o fato de alguns nomes brasileiros galgarem projeção na Europa, porque a excelente qualidade da música que fazem logo conquista público e crítica. A baiana Rosa Passos é um exemplo citado pelo amigo paraibano.
Existe certa freqüência de apresentações de cantores e grupos brasileiros. Torna-se inviável, até mesmo do ponto de vista financeiro, que possamos assistir todos eles. Há cerca de um mês Djavan fez show em Madri. E nesses dias terá um outro de Toquinho e Maria Creuza. Caetano Veloso também já fez sua turnê espanhola este ano.
Outro dia quem esteve aqui em Salamanca foi Gilberto Gil. Com seu extraordinário show na “Plaza Mayor”, ele foi a principal atração do encerramento de um Festival Internacional de Artes. Nosso estimado ministro, apesar dos anos avançarem, continua com a mesma presença de palco. Nem preciso dizer que a comunidade brasileira formava a “turma do gargarejo”, dançando e vibrando a cada sucesso relembrado. Todos com a alma cheirando a “talco como bumbum de bebê”.
Algumas rádios espanholas dedicam programas específicos a música brasileira. E certamente não o fariam se não houvesse interesse de seus ouvintes. Um desses programas, chamado “Movida Brasileña”, é apresentado pelo amazonense Reginaldo Lima, que há muito vive na Espanha. Existe outro programa que é de responsabilidade do escritor e crítico musical espanhol Carlos Galilea.
Carlos Galilea, além de autor de considerável bibliografia sobre música brasileira, escreve com regularidade sobre o tema para o jornal El País.
E por falar em livro, o festejado “Chega de Saudade”, de Rui Castro, acaba de ser publicado em espanhol. Ele, Rui Castro, esteve outro dia aqui proferindo uma palestra no Centro de Estudos Brasileiros. Ninguém pode duvidar de seu grande conhecimento sobre MPB. No entanto, no decorrer da palestra o que chamou a atenção de nós brasileiros foi certa dose de exagero de sua parte em relação aos reiterados elogios ao Rio de Janeiro. Todos sabemos da importância cultural do Rio para o Brasil, mas o exaltação beirava exagero mesmo.
Lá pra tantas, embalado em sua empolgação, ele falou que o samba era genuinamente carioca... Uilma Rodrigues, baiana das boas, não se conteve e sapecou uma pergunta bem apimentada:
-E como fica o Vinicius de Moraes que em “Samba da bênção” diz que “o samba nasceu lá na Bahia”?
O Rui, não querendo polêmica e nem encompridar a conversa, saiu-se com uma resposta meio sem graça, dessas que não convence ninguém; disse apenas que deveríamos relembrar que o poetinha, naquela época, estava apaixonado por uma baiana.
Bem, mas voltando a MPB, sem a menor sombra de dúvidas, nossa maior referencia é “Garota de Ipanema”. Já tive o prazer de escutar seus acordes ao entrar em restaurantes ou até mesmo em praças públicas, sendo executada por artistas de rua. E, seja aonde for, todas as vezes que a escutamos, parafraseando o saudoso Dorian Jorge Freire, a emoção não deixa de tocar a corda tensa do Stradivarius dos saudosos corações.