QUARTA-FEIRA DE ALMOÇO

Aquela lanchonete ululava, com pessoas vociferantes tentando no espaço possível, colocar algum peso em seus gástricos estômagos. O dia está de bom humor. Sentado até que calmamente em uma espremida mesinha, observava aquela caótica situação, quando, sem dar muita atenção para ninguém, entrou quase que solene, aquela figura. Quase ninguém se deu conta. Aproximou-se devagar do metálico balcão. Trazia em abraço um chihuahua cara de rato, aconchegado junto ao moderado peito, este coberto por um sensual southien branco, visto na transparência do seu esportivo camisão. De pernas meio roliças, por sua vez, revestidas por uma calça de veludo cotelê bege. Trajava um sapatinho marron-glacê, tipo Glenn Miller, mais para anos 40.

Seus cabelos pretos, nada escondia, de tão curto, a sua cara sonsa de trinta, muito menos os seus olhos fundos, com olheiras melancólicas, de bebericos passados. Na mesma calma com que entrou,aproximou-se junto ao metálico balcão. Pediu um sorvete de creme e caminhou até o opaco caixa. Fluente e compassadamente, conversou com o esquelético dono da lanchonete em francês durante alguns minutos. Pagou então o sorvete e saiu. Ganhando a movimentada rua, para, como surgiu, desaparecer em um fusca estranho, verde oliva, provavelmente 66. Ainda sentado em tão minúscula mesa, após esse recorte, nada mais interessava. Nem a ululante lanchonete, nem suas pessoas neuróticas, tão pouco as sobras do parco almoço, ora devorado. Nada mesmo.

Quase vou embora, sem pagar a estúpida conta.

Peixão
Enviado por Peixão em 19/04/2005
Reeditado em 11/04/2015
Código do texto: T11942
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