Lambe-lambe explosivo
Itamaury Teles
Embora a lei eleitoral esteja cada dia mais severa, com proibições de toda natureza, cabe aos candidatos usarem da criatividade para convencerem os indecisos e arredios cidadãos, buscando brechas legais por onde possam transitar, de forma eficaz, na garimpagem dos votos.
Agora mesmo, estamos em pleno período eleitoral. A gente percebe isso no ar, com carros de som azucrinando nossos ouvidos com jingles nem sempre muito criativos, nem agradáveis aos ouvidos. Mas fazer o quê, se a lei permite aos pleiteantes divulgarem sua candidatura por esse meio, embora alguns o façam com excesso de decibéis e som roufenho de taquara rachada?
O cargo de vereador, por exemplo, é um dos mais difíceis de ser conseguido via eleição. Isso porque em quase toda família há um candidato e os votos são conquistados com muita dificuldade.
Assim, quem não tiver um reconhecido trabalho prestado à comunidade, ao longo dos anos, sente na pele o quão difícil é ganhar visibilidade, nos poucos segundos de propaganda eleitoral gratuita, no rádio e na televisão.
Por esses dias, meu primo Goda Porreta quis saber se eu seria candidato a vereador e veio dar-me conselhos para não mexer com isso, pois tivera uma experiência da espécie, na década de 80. Sério, falou-me de sua decepção com a política, pois perdera a eleição “por causa de 48 votos”.
Quando, admirado, indaguei se haviam faltado só 48 votos, ele, matreiro, explodiu em gargalhadas:
- Não, primo, só tive 48!
Não faz muito tempo, um conterrâneo meu engendrou tática que julgara infalível, para aproximar-se mais do eleitorado da zona rural, em sua campanha a vereador.
Adquiriu em São Paulo uma velha máquina fotográfica, modelo lambe-lambe, daquelas em que o fotógrafo se cobre com um pano preto e fica por detrás daquela caixa quadrada montada sobre tripé. Na Praça Dr. Carlos, em Montes Claros, ainda podemos ver algumas dessas prosaicas máquinas fotográficas em pleno funcionamento...
Pensou o meu conterrâneo em fazer fotos pelos grotões porteirinhenses e presentear as famílias com aquele mimo, adornado por vistoso porta-retrato.
Para que sua idéia florescesse e desse benfazejos frutos eleitorais, tinha que sair em todas as fotos, ao lado do vetusto chefe-da-família. Com esse objetivo, comprou um timer, também conhecido por temporizador, para que a máquina fotografasse sozinha, depois de feitos todos os ajustes de foco, abertura do diafragma e velocidade, em função da luminosidade ambiente.
Assim, saiu o Nelson Retratista radiante e esperançoso pela zona rural, tirando suas fotos.
Botava todo mundo na porta da casa, armava o tripé, fazia os ajustes, ligava o timer e corria para sair na foto.
Ia tudo muito bem, até que resolveu ir a um dos mais recônditos lugares do município, onde morava um pessoal meio chucro, quase bugre, que não conhecia nada dessas modernagens de tirar retrato. Nem mesmo sabiam o que era aquilo.
Nelson pediu que todos vestissem as melhores roupas e se postassem na frente da casa. Assim foi feito. Havia menino com um chinelo no pé direito e outro com o chinelo apenas no pé esquerdo... Alguns menores, por falta de roupa, ficaram pelados mesmos, agarrados na saia da mãe...
E Nelson foi pra máquina, ajustou o que devia, acionou o timer e correu. Quando correu, o pessoal achou que ele corria porque algo de ruim iria acontecer, que algo iria explodir. Aí só se viu gente quebrando mato nos peitos, numa fuga desembestada.
E foi um custo arrebanhar todo mundo de novo...