Passava a mão na bunda do General

O esmerado sintágma marchava em torno do coreto da pracinha adrede ajardinada. A bandinha marcava a coreografia simetricamente perfeita - passos, movimentos e malabares - da tropa como se fosse comandada por um só cérebro. Bonito de ver!

Externamente, era comandada por um cérebro: o General Otto. Inteiro teso, somente os pés, braços e olhar se moviam. O bigode vasto e preto aparado com precisão matemática, idem ao engomar da farda e engraxar das botas reluzentes. Comandava aos soldados feito fossem marionetes sob a ponta dos dedos dele.

No palanque as autoridades aplaudiam espontaneamente o cortejo militar. O governador e a primeira dama entreolhavam-se orgulhosos, como se sorvessem algum mérito pela organização militar. Um desavisado diria serem eles os criadores da disciplina e da ordem fardada.

As demais autoridades, a arraia-miuda - prefeitos bajuladores, deputados carniceiros, secretários acariciadores de colhões e mais uns - estes nem os adjetivos mais vis os definiriam - imitavam a autoridade máxima ali presente. Mesmo àqueles outrora torturados pelos mesmos militares, mostravam-se fascinados, imitando o chefe de Estado presente e, assim, diminuindo o risco de ficarem desempregados.

Tanto formalidade, tanta impecabilidade, só serviam para eu tremer cada vez mais. Postas as devidas ressalvas, eu me sentia um homem bomba, preste a me auto-explodir. Chegava a hora, as mão frias suavam, o coração já não palpitava, trepidava e podiam-se ouvir-me ao pulsar das veias... Veio o sinal. Eu tinha que cumprir minha missa.

Subverter a ordem estabelecida - cara e pose de eterna - era minha missão. Como não se usa homem-bomba por aqui, eu tinha que passar a mão na bunda do General Otto!

Passei.

Quando me levavam aos porões, jamais desativados, acordei suadinho... Vai ver eu sonhava com a Bolívia!