CALOS E FRIEIRAS
para Alvaro e Geny
Envelhecemos a olhos vistos. Poucos casais vivem cinquenta e um ano de casados, felizes!... Em torno do nosso olhar, pés-de-galinha. E sorrimo-nos, e beijamo-nos... Sexo? O possível. Amamo-nos a olhos vistos. Enrugamo-nos, mas não adoecemo-nos. Em nossos pés, em nossos lábios: frieiras!...
Depois, a tosse. Mãos sobre os peitos, ausculta-se respirações. Mais um copo de água mineral na hora certa do remédio. Preocupa-nos aquela neta mais nova. Os livros têm que ter letras gigantes; as cobertas, mais grossas. Fechada está a janela e há um urinol em baixo da cama. A reunião com toda a família será no próximo domingo. Os calos me doem. Teu sono, de passarinho. Choverá às duas da manhã. Calos são calos. A noite anda. É impoissível fugir da sensação de morte próxima.
Cinquenta e um anos de casados: bodas intermináveis!...
De pés juntos, dormiremos acarinhando as nossas próprias frieiras. E mais um copo de água natural. À artrite, analgésicos; à tosse, xaropes; ao resfriado, muita vitamina e repouso. Choverá. Calos não mentem. Duas rugas a mais em torno do nosso olhar. Pés-de-galinha!... Entreolhamo-nos dormindo. Rimo-nos e cochilamo-nos. Silêncio!...
No mais, depois dos carinhos, tudo é gesto.