Entre meus braços e algum lugar

Eu a deixei na escola bem mais atrasada que o normal, e parei mais longe também. E lá foi ela, sozinha, equilibrando-se no seu mundo de malas (a mochila, a lancheira e a mala da natação), mas no mesmo passo que teria se tivesse que fazer hora, de tão adiantada. E nesse curto espaço de calçada, entre meu carro e a porta da escola, eu a vejo assim, sozinha, exposta a todos os perigos - ainda que sob minhas vistas.

E incoerentemente é para isso que a preparo: para o espaço entre meus braços e a porta de algum lugar. Ou talvez apenas para o espaço vazio e desconhecido de fora de meus braços.

Faz tempo que não choro, mas ao ver seu passo sem pressa mais uma vez, emocionei-me. Não pelo medo, nem pelo futuro incerto, com o qual evito lutar em pensamentos absolutamente inúteis, mas sim pelo tamanho da missão que tenho; e também por gratidão, pela possibilidade que tenho de crescer, de me tornar melhor, através desse ser luminoso que me ensina dia a dia. E com olhos embaçados eu peço, a Deus, aos deuses, às energias que nos movem, que me dêem sabedoria para jamais conduzi-la pela mão, mas para fazer com que ela consiga conduzir a si própria e preencher com luz também este espaço desconhecido, além da minha vida. E que a luz que ela emana volte para ela cada vez mais brilhante, a iluminar-lhe a calçada para que ela possa enxergar a campainha da porta de algum outro lugar, principalmente quando meus braços virarem pó.

Outra vez escrevo sobre ela... e não posso prometer que será a última vez.