LENÇÓIS BORDADOS POR UM PASSARINHO

Lençóis bordados por um passarinho.

Marília L. Paixão

Sempre que alguém me pergunta se estou gostando da casa nova eu digoque ela é um paraíso. E é mesmo! Eu já acordo me sentindo em contato com a natureza. Deixo o mundo entrar depois que o jornal chega.

Tomo o meu café eufórica, me sentindo rica. Nem penso em sair por ai acotovelando gente como antes acontecia. Eu rio para o espelho e até longe do espelho. Nunca me passou pela cabeça que uma casa deixar-me-ia assim tão abestalhadamente feliz como se eu fosse à dona dos ovos de ouro.

Nesta casinha que é tudo de bom tem uns canteiros para eu plantar rosas. Mas como eu não sei plantar nada, apenas cisco o terreiro assustando os passarinhos e mais sorrio. Quem sabe eu deveria plantar uns versos aqui? Cada um planta o que sabe, não é mesmo?!

Engraçado que mesmo tendo em vista essa paisagem campestre vez ou outra tenho imaginações da cidade que me preocupam. Fito a distância do fio da cerca elétrica e fico pensando se um ladrão não passaria aliou ou se o sinal realmente vai tocar alto o bastante caso alguém o toque. Confiro se as portas estão bem trancadas todas as noites e só depois me deito tranquila. ainda assim penso em um momento de viagem como seria a minha casa ali sozinha...

Deve ser por eu ter uma mente urbana. Deve ser! Passeio lá fora e olho para um ou outro que passa com olhos mais desconfiados que sorridentes. Ainda não me aproximei de nenhum vizinho ou vizinha e sei que é curta a vida e permaneço mais dentro que fora. Sou sem graça e não sou de contar histórias. Coloco num texto o que não coloco na fala que timidamente cala.

Eu olho essa casa como quem diz que a adora e nunca adorei nada material com tanta certeza. Por isso que quando um passarinho foge quando abro a janela eu me emociono. Da vontade de dizer: passarinho, eu te amo, mesmo você sujando meus lençóis de cocô.

Talvez você seja o maior vilão da minha casa. Talvez seja só você e o barulho da calha nas noites de grandes chuvas. Sem falar no jornaleiro que continua o mesmo de sempre aparece e some acelerado num repente. Mas e se o jornaleiro for do sexo feminino? Então é uma aliada do passarinho.

Quem sabe a mente é a nossa maior vilã?! Quem sabe o mesmo lençol pode ser bordado pelo passarinho. Quem sabe o jornaleiro é uma jornaleira boa mãe de família doida para voltar para o seu bebê. Ou então é uma inimiga oculta que me traz o jornal com raiva por ser parte da sua jornada. Neste caso melhor o passarinho que um risco de ganhar uma jogada de jornal na cara. Por vias das dúvidas pedirei ao passarinho que borde numa toalha de chá e o jornaleiro eu deixarei para lá.

Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 02/09/2008
Reeditado em 07/09/2008
Código do texto: T1157677
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