CARTA DE UM LADRÃO DE GALINHAS

Caros Juizes do STF

Desculpem a ausência do “excelentíssimo”, mas não me sinto muito confortável com esses termos, que para mim são puxa-saquismos. Sou um homem simples, de palavras diretas, condenado a três anos de cadeia por ter roubado galinhas e alguns sacos de arroz da fazenda de uma cidadão de grande fortuna, um deputado aqui das bandas do Mato Grosso.

Escrevo essa carta, pois não tenho dinheiro para advogados e depois de dez meses encarcerado, ainda aguardo a visita do defensor público e tenho uma pequena esperança que alguém leia minha História e a faça chegar até as suas justas mãos. Escrevi de propósito “história” com H e com maiúscula, pois a minha estória é a própria História do povo que vive ao relento e por não ter oportunidade de ganhar honestamente seu alimento, furta e colhe vento para não ver suas crianças chorando e passando fome.

Eu sou um ladrão, não por profissão, mas por ocasião. Sou peixe pequeno e justamente por não ser um tubarão, fui pego e sem julgamento, fui condenado, e aguardo calado, a minha liberdade. Sei que sou culpado, sim roubei aquilo do que sou acusado e oro ao Senhor dos Perdões por minha absolvição. Só Deus pode me perdoar em relação a meus pecados, mas os Senhores podem me dar à chance de voltar às ruas e tentar pagar com trabalho os meus atos. Só não concordo em pedir desculpas ao Deputado que jurou que olharia por nós, eleitores, na eleição passada. Cada um faz o que pode e desculpem-me se eu não conseguir pedir perdão a esse nobre cidadão que, de acordo com o que vi na televisão aqui da prisão, está sendo acusado de usar o dinheiro do povo na sua fazenda e outras tantas propriedades aqui na região. Posso estar errado, Senhores Juizes, mas isso, aqui na minha terra é crime maior que roubar galinha ou grãos de feijão.

Termino essa carta, Senhores Juizes, evocando a sabedoria do povo e dos provérbios populares como minha única prova de inocência, pois essas palavras é tudo o que tenho de argumento, e nem preciso ser Juiz de direito para saber que “ladrão que rouba ladrão, merece mesmo é absolvição”.

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