Impossível
Ao lado deste boêmio que vos fala, senta-se, com um charuto pendendo por entre os dedos, óculos com lentes grossas, wisk com gelo e toda sua formosura, Vinicius de Moraes. Chega assim, meio sei lá, assoviando um cantarolado qualquer. Chega de Saudade, sim, recordo-me, ainda não havia feito sucesso. Pois então, pergunta-me. Sensacional, lhe repondo. Já meio embriagado, pois tinha entornado algumas doses sucessivas, dor de cotovelo e morrendo de amores, puxa do seu bolso uma caneta, quebrada ao meio, e ali mesmo, no bar, ao meu lado, põem-se a escrever. Pergunto-lhe se algum bêbado já havia difamado sua pessoa por insano, louco indubitável. Não, é sua significativa resposta. Instantes, porém, minutinhos ali, chega Tom Jobim, simpatia única esbanjada em seu rosto harmônico. Sorrindo feito criança, como, quem sabe, é músico como poucos. Pula o balcão do bar, e senta-se ao piano. Alguns arranjos são feitos ali, nada de mais. Chega Toquinho com sua viola, senta-se a alguma distância, me acena com a mão, bigodinho, e pisca seu olho esquerdo, sedutor, como ele mesmo se referia. E assim, ali mesmo, começa, numa noite estrelada e charmosa, cheia de mistérios indecifráveis, um sonho maluco, de quem vive a imaginar o impossível.