CHIQUINHO
Vovó gostava de criar filhotes de pássaros em casa para domesticá-los. Cuidava destes ainda sem penas com papa de fubá e de frutas.
Lembro ainda dos filhotes de maritacas, de pássaros pretos e canários da terra que ela criava com todo carinho dentro de casa.
Me lembro em especial de um pássaro preto que foi batizado de Chiquinho!
Foi pego ainda bem novinho, e tratado com muito carinho e cuidado.
Cresceu e acostumou com todas as pessoas da família!
Ele possuía uma gaiola que ficava pendurada na sala, onde ele dormia e ficava. Mas a gaiola estava sempre com a porta aberta para que ele saísse quando quisesse.
Ele gostava de voar para o ombro de alguém e pedir carinho, abaixava a cabeça esperando um cafuné!
Ah como ele gostava que coçasse a sua cabeça!
Estava sempre feliz a cantar e quando queria algo dava aquele piado que todos sabiam interpretar.
Costumava voar até alguma árvore próxima, ir até o pomar e depois retornava para a sua gaiola.
Cantava um canto alegre e firme e era um encanto, uma euforia só!
Incrível, atendia sempre que ouvia seu nome, sabia que ele era o Chiquinho! Acreditem!
Certo dia apareceu pela fazenda, de passagem, um caixeiro viajante, um viajante que trazia produtos da cidade grande para vender.
Vovó interessou-se pelos tecidos e permitiu que ele entrasse até a sala e mostrasse o que havia de novidade.
Logo foi dizendo:
- Ah que pássaro lindo!
- E ele não foge, com esta portinha aberta?
- Não - respondeu vovó – ele foi acostumado a viver em liberdade.
Mas algo estranho começou a acontecer!
Chiquinho que era um pássaro alegre, calmo e manso começou a demonstrar um comportamento estranho!
Saltava de poleiro em poleiro e soltando alguns piados tristes!
Algo não estava normal todos perceberam.
Assim que aquele estranho se foi vovó apressou-se a pedir que eu fosse correndo chamar a Mariana.
Como já era de costume quando alguém adoecia mesmo um animal da fazenda Mariana era solicitada para vir benzer.
Em pouco tempo cheguei pouco a frente da Mariana que veio já preparada com um galho de arruda e pegando o pássaro no colo passou ao ritual de benzedura aspergindo água com aquele ramo de arruda e balbuciando algumas palavras que não podia entender.
Chiquinho estava quase paralisado, sem ação, não era mais aquele pássaro alegre e esperto que conhecíamos!
Mariana disse:
- “Cumade Nita”, a coisa tava feia, este homem botou um mal olhado muito brabo nele!
- Coisa pesada, mas ele vai ficar bom, deixa ele ai na gaiola e vai ver amanhã ele vai estar bom de novo!
Eu que estava lá de pé encostado na porta observando atento todo o ritual apressei a sair e aproveitar o resto da tarde que terminava para brincar, correr lá pelo pomar.
Sei que Mariana, uma negra empregada antiga da família ficou ainda um pouco conversando com vovó e vi quando ela passou na estrada e disse:
- “Inté Adarto!”
Ai disse também o “inté” e continuei a brinca!
Só sei que no dia seguinte ao levantar encontrei o Chiquinho todo serelepe a saltitar e já arriscando algum canto afinando suas cordas vocais..
(Tudo aconteceu na minha infância na fazenda de meus avós, em Minas Gerais, por volta de 1955)