O CHÁ-DE-BURRO


Parece que foi ontem...

Eu me lembro que uma vez meu pai me levou ao mercado, pois eu reclamava de fome. Procuramos um quiosque qualquer e fomos a um lugar onde se vendia chá-de-burro.

- Chá-de-burro? Perguntei.

- Sim, disse meu pai, sorrindo -, vamos comer um chá-de-burro!

Chá de burro é um típico prato doce, feito com milho verde ou branco, podendo ser adicionado leite de coco, pedaços de cocos ou amendoim. No Brasil afora é também conhecido como canjica, corá, jimbelê ou mungunzá.

Certa vez presenciei um fato inusitado:  num desses quiosques de mercado, um menino, de uns nove anos, magrinho, camisa rasgada e chinela com buraco no calcanhar, à espreita, engolia com os olhos o chá-de-burro de um rapaz.

O dono do estabelecimento enxotou o menino, mas o rapaz, de bom coração, interceptou a agressão e, sabendo da resposta, perguntou ao menino o que ele queria, oferecendo-lhe uma moeda. Com voz fraquinha e olhar amarelo o menino pediu:

- paga um chá-de-burro pra mim? Ele pagou, descobrindo ali que a sua canjica tinha outro nome por aquelas bandas, e brincou com o menino: 

 

- Agora você vai ficar mais inteligente, não é mesmo?

- Minha mãe sempre diz que chá-de-burro faz a gente ficar inteligente!

 

Com o menino alimentado, a conversa continuou com amenidades. Feliz e alimentado, o menino saiu agradecendo o bônus de uma moeda que lhe foi ofertada pelo rapaz.

A cena me fez pensar que a frase do menino bem que poderia ser verdadeira e o quanto de chá-de-burro a humanidade ainda teria que consumir para que não existissem desigualdades tão gritantes no mundo.

Talvez um estudo honesto e um pouco de boa vontade política pudesse explicar a aberração da dissonância entre essas duas grandezas econômicas: a enorme produção econômica e a flagrante e vergonhasa distribuição de renda no Brasil.                                                      

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