SACUDINDO AS RAÍZES AO VENTO




          "Voltei, aqui é meu lugar", dizia a letra de música antiga. Mas existe mesmo esse negócio de um lugar certinho pra gente, algum ponto neste mundo onde nos encaixamos perfeitamente, como tendo sido feito um molde vazado pra nos acolher? Eu não creio, mesmo. Isso é só conversa de letra de música antiga, do tempo em que as pessoas andavam devagar, comiam devagar, onde o ano custava a chegar ao fim e as datas tinham importância. Onde a gente esperava por uma festa qualquer com um mês de antecedência, na hipótese mais otimista. Eu criança, lembro bem, minha mãe ainda resolvia fazer umas roupas pras meninas, fazia igual pra mim e pra minha irmã, e a gente lembra de tudo, até do cheiro do pano novinho, de algum detalhe na feitura, um erro que o pai ajudou a corrigir, que ele sabia fazer tudo com suas mãos de artista.
            E aí chegamos a uma idade onde parece que tudo já aconteceu, quando a árvore que já deu seus frutos, muita sombra e perfume de flores na primavera , enfim parece pronta pra começar o processo inverso, ou seja, não mais crescer, e após o inverno, apenas ter a teimosia de manter o verde das folhas, abrigar os pássaros e fazer a tal fotossíntese mecanicamente até virar só um tronco retorcido bom pra fazer lenha.
            Uma árvore que já perdeu algum galho, por fatalidade ou simples ação das intempéries, que tem até uma ferida no tronco, por onde surgem formigas que lá fizeram morada e que abriga plantas parasitas, e aí lembro daquelas flores de um rosa forte cujas pétalas eram pontudas e daquela outra que não possuía folhas, era toda em talos arredondados e finos e possuía umas bolinhas brancas que a gente não podia comer porque diziam ser venenosas. Mas acho que provei, pois me vem uma doçura à boca quando lembro delas.
Uma árvore que tem todo o tempo e não tem nenhum, que abre sua copa aos ventos e ao sol, ao sereno, que conhece as voltas da existência, que viveu debaixo de outros sóis, mas que está descobrindo que apesar de estar plantada neste chão, não é de lugar algum, e começa a sonhar com outras paragens, visto que as paisagens mudaram, as possibilidades estão surgindo e o que outrora seria somente um sonho, hoje pode ser concreta realiade. Basta um pouco de coragem, um certo olhar por cima e além da cerca de uma vida que já se cumpriu. Basta querer...
              E estou vislumbrando um desfecho inesperado, tentador, uma virada de mesa no melhor estilo. Vejo que há tribos e tribos neste mundo , constelações de tentadores astros em qualquer parte e a tudo eu terei acesso, basta querer. Há núcleos com seus elétrons, e que, comprovando esta história da física quântica de que elétrons podem movimentar-se de forma inseperada, acho que sou um. deles Saltarei daqui pra lá, de lá pra cá, e onde é lá e cá neste mundão sem fim? Isso pretendo descobrir. quando romper o solo e sacudir as raízes ao vento. E pra quem aprendeu a voar, elas não farão a menor falta...
tania orsi vargas
Enviado por tania orsi vargas em 26/08/2008
Reeditado em 26/08/2008
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