Eles fazem bem feito.

 

Passei alguns dias na cidade de Gramado, trabalhando obviamente, onde tive a oportunidade de acompanhar de perto as atividades da 36ª edição do Festival de Cinema. Uma cidade com vocação consolidada para o turismo e totalmente diferente destas cidades funcionais, onde estamos acostumados a desenvolver nossas atividades. Gramado, quando reúne artistas, produtores, diretores, intelectuais e celebridades, fica parecendo uma cidade fantasia, pois se tem a sensação que tudo é muito fácil, lindo e glamouroso; que as contas não existem e, se eventualmente aparecerem, vêm carimbadas com a inscrição de pago, uma cortesia de um patrocinador qualquer.

As discussões mais freqüentes giram em torno dos serviços oferecidos nos hotéis, das festas mais badaladas, os possíveis patrocínios a serem fechados, as roupas e modelitos que determinada personalidade esta usando, entre outras mil e uma futilidades. Já a premiação e a qualidade dos filmes em exibição tem uma discussão restrita aos produtores, atores e distribuidores. Os restaurantes, esses vivem lotados. A comida é muito boa e farta, mas com preços um pouco salgados. Os pagamentos efetuados com cartão ampliam a sensação de que a vida é um sonho, ou seja, basta apresentar um pedaço de plástico e, ao digitar a senha, ainda se recebe em retribuição um largo sorriso.

Gosto muito de Gramado e arredores, onde o turismo tem papel importante, mas manter a infra-estrutura adequada não é tarefa simples. No entanto, é um mundo acessível para poucos, embora num país com cerca de 184 milhões de habitantes, esses poucos sejam o suficiente para lotar todos os hotéis e pousadas da região. Um bom negócio que deve ser incentivado em todas as regiões do nosso estado. Em Gramado percebe-se claramente o empenho dos órgãos públicos em manter e ampliar essa fonte de receita. È claro que sempre tem os que se sentem excluídos e marginalizados, sendo que uma dessas queixas vem de uma parcela da população rural, que alega estar sendo abandonada em relação à atenção dispensada a população e a estrutura urbana. Esta é uma discussão que não me cabe, mas mesmo sem conhecer as razões, me parece uma reivindicação legitima, uma vez que estes trabalhadores desempenham papel fundamental para a manutenção do estilo de vida urbano.

         O serviço prestado seja por recepcionistas, garçons, camareiras ou autoridades, amplia essa sensação de um mundo de fantasia, pois parece que nenhum desses profissionais tem qualquer problema, já que satisfazer os caprichos ou manias dos turistas parece ser um prazer para eles. A atenção dispensada, certamente é muito maior a que dedicam aos seus familiares e amigos. Tem-se à impressão, sob um olhar menos atento, de que não agem por obrigação, mas sim, por serem pessoas extremamente cordiais e gentis por natureza. Pode-se pensar que foram escolhidos aleatoriamente para desempenhar as funções, pois as exercem com tanta “alegria e disposição”, que parecem pertencer a uma espécie humana superior. Esses profissionais deveriam servir de referência para algumas empresas capacitarem seus funcionários no atendimento a seus clientes, a começar pelos órgãos públicos, que carecem de um serviço mais humanizado no atendimento ao cidadão.

Tudo isso faz com que tenhamos a sensação de estar vivendo numa cidade ideal, entretanto, a maior parte dos seus moradores, dentre os quais, estes que prestam esses serviços perfeitamente serem pessoas que levam uma vida real como cada um de nós. Têm os seus problemas, contas a pagar, mau humor, relacionamentos que os sufocam, ou simplesmente conflitos internos que os atormentam. No entanto, se vêem obrigados a deixar transparecer somente presteza, cordialidade, bom humor, ou seja, o melhor, o lado fácil e feliz da vida. Um exercício que merece ser imitado por todos nós, para com os que nos cercam. Uma tarefa que deveria ser diária, mas que, se inicialmente não for possível realizá-la todos os dias, que seja pelo menos algumas vezes por semana, assim, gradativamente iremos incorporar novas atitudes, até se tornarem um hábito. Isso certamente vai se multiplicar e difundir boas maneiras, atraindo cada vez mais pessoas gentis e agradáveis ao nosso convívio. Talvez isso não resolva nenhum problema prático, aqueles que nos perturbam o dia a dia, mas certamente diminui o estresse e o tumulto ao nosso redor, possibilitando melhores condições, para que busquemos a solução de forma tranqüila e equilibrada.

A dedicação que a população das cidades, voltada ao turismo, dispensa aos visitantes é fruto da necessidade de manter seus negócios, no entanto, também é uma prova clara que é possível superar os aborrecimentos pessoais, mesmo sendo por “obrigação funcional”, como é o caso dos trabalhadores da área de hotelaria ou por superação pessoal. Seja qual for à forma é perfeitamente possível transmitir ao próximo essa sensação de bem estar, através da cordialidade e criar um circulo virtuoso ao nosso redor.

Todos sabemos que a toda ação corresponde uma reação, não necessariamente inversa e proporcional então, procure agir de forma a satisfazer as necessidades dos que o procuram, que o retorno será gratificante. Obviamente que não se pode agradar sempre, mas mostrar-se e agir com presteza e cordialmente é um grande passo para iniciar uma transformação pessoal e social. Esses dias em Gramado me permitiram várias observações e muitas reflexões, por isso fiz este relato para convidá-los a resgatar a cordialidade e a presteza a começar no seio das nossas relações. Boa semana.