O SAFADO DO TEODORICO

Coitado do lindinho deste nosso Brasil e de seus homens públicos. Não falta quem não queira sentar-lhe a peia. Essa gente devia espelhar-se na brasilidade de Ariano Suassuna. Será que não estão enxergando que estamos caminhando (ESTAMOS...?) e que temos cá o nosso Theodore Roosevelt ( TEMOS...?), que andou lendo “Como vive o outro lado” (LEU...?) e por conta está atacando de frente os Morga, Rockfeller, Vanderbilt (ESTÁ...?), pondo para funcionar as leis , suprimindo a legislação protecionista, introduzindo impostos progressivos, debilitando o poder dos monopólios, tudo de acordo com a massa trabalhadora (É...?)

Mas isto é outra conversa. Os meus olhos estão voltados para a leitura de um livro genial e de fácil compreensão do egiptólogo Topsius, sob o título: A Síntese Monoteísta da Teogenia Egípcia, considerada nas relações do Deus Ptá e do Deus Imbotep com as Tríades dos Nomos”.

Tal leitura me foi sugerida pelo safado do Teodorico, sobrinho da senhora Dona Patrocínio das Neves, modelo de virtudes cristãs e viúva do Comendador G. Godinho, que conheceu o sobrinho do egiptólogo de nome também Topsius, numa viagem que fez à Terra Santa, com a finalidade de visitar Jerusalém e todos os sacros lugares que padeceu por nós o Redentor, isto por determinação da beata “titi”, que custeou a viagem do sobrinho, exigindo-lhe que tal viagem teria de ser feita com toda a devoção, sem deixar pedra por beijar, nem perder novena, sem ficar lugarzinho em que não rezasse ou o terço ou a coroa. Esperando ainda que o sobrinho lhe trouxesse uma santa relíquia, uma relíquia milagrosa que lhe servisse nas aflições e que lhe curasse as doenças.

Sem desconfiar da falta de piedade cristã do sobrinho, “que só pensava em fartar o bandulho”, tudo foi arranjado pela titi. E dessa forma, para Jerusalém partiu Teodorico.

Pondo de lado as recomendações da titi, que foram as seguintes: “Se eu souber que nesta passeata tenhas tido maus pensamentos e praticado uma relação, ou andado atrás de saias, fica certo que, apesar de seres a única pessoa do meu sangue, e teres visitado Jerusalém e gozar de indulgências, havias de ir para a rua, sem uma côdea, como um cão!”

O safado do Teodorico meteu-se em mil e uma aventuras e pouco rezou, tanto que, na hora de voltar, ao invés de uma relíquia santa, sem ao menos desconfiar, trouxe para a titi, embrulhado numa caixa, que foi aberta com toda cerimônia, aos pés do Cristo crucificado, na presença de outros beatos e dois padres, uma camisa de dormir, enfeitada de rendas, com laços de seda, relíquia de amor carnal dado pela rapariga inglesa de nome Mary, que conheceu em Alexandria, acompanhada de um bilhete: “Ao meu Teodorico, meu portuguesinho possante, uma lembrança do muito que gozamos (a) Mary”.

Desnecessário dizer, que o Teodorico foi deserdado e enxotado de casa pela titi, feito um cão.

A titulo de esclarecimento, esta história eu li em “A Relíquia” de Eça de Queiroz, livro escrito em 1887, considerado anticlerical e, ao mesmo tempo, um monumento à hipocrisia, saído do imaginário do fabuloso escritor.

Zélia Maria Freire
Enviado por Zélia Maria Freire em 21/08/2008
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