Revolta

Revolta. O que revolta não é a dor física, porque essa passa. Revolta é a seqüela. O trauma permanente na alma que dói para sempre. Uma sensação de impunidade e vitória do mal. Vitória dos mesmo que até hoje continuam vencendo. Nas falsas beatas caridosas que me dão nojo. Na sociedade perversa, falso-moralista e arrogante criadora de ongs que fazem dos pobres sua atração de circo e marketing pessoal. Não vejo mudanças nem ascensão no patamar humano brasileiro. Vejo uma mudança de foco. O que se fazia impostamente se faz brilhantemente. Muito não se diz e mas muito se faz.

O que revolta são os carros importados, os tieres bem passados, um sorriso engessado e uma certeza, de que roubam dinheiro do povo. Me enojam esses “doutores” por quem não tenho o mínimo respeito. Se vem acompanhados de siglas me revoltam! Seus ternos e gravatas que deviam cheirar a sangue e a cadáveres em putrefação. Seu gel no cabelo, seu português correto e piadas prontas na ponta da língua para dar mais firmeza ao seu ar de superioridade. Todos são sociólogos, economistas, teologistas, administradores, o diabo! E a cada quatro anos dão esperança a um povo miserável que no fundo sabe que mais uma vez será enganado, mas que no dia marcado, por obrigação e honra cívica elegerá o próximo. Enquanto esses fazem acordos em salas fechadas de favorecimento em caso desse ser este próximo. As pessoas morrem, se matam na favela, adoecem em filas, passam fome na rua ou dentro de casa. Jovens perdem a esperança e os sonhos no desemprego. Se tornam bandidos por oportunidade. Pobre matando pobre e eles assistem no Jornal Nacional horrorizados que desta vez a morta era filha de coronel! Não tem noção de quantos filhos de Zé Ninguém morrem por dia! Quer dizer... sabem porque recebem estatísticas nos seu s gabinetes. Como que não se sentem assassinos? Como podem dormir de noite sabendo que aquela cama king size tem na espuma dinheiro de ambulâncias que salvam vidas. Vidas de pobres! Vida de pobres! Essa é a explicação! É impressionante o poder de coisificação de seres humanos que essas pessoas tem. Somos objetos, votos nas urnas, uma cara sofrida para uma capa de jornal, uma peça do jogo, um gerador de impostos, um cpf, um número na pesquisa. Cansa ser isso tudo! Cansa assistir os peões desse jogo saírem antes do rei e da dama.

Pobre coitados de nós que nem a isso reagimos. Reagimos nos embecando, escolhendo a melhor roupa no guarda roupa e mais uma vez confiantes entrar numa fila de emprego, usando o melhor português aprendido para fazer parte do outro lado. Para que no final do mês seja mais fácil andar na rua e julgar os que alí continuam tentando sobreviver. Adoramos os mais ferrados que a gente desde que sejam inofensivos. Somos todos ordinários. Todos que nos calamos.

Ficamos iguais a eles! Eles que calam tão elegantes, só falam na hora certa o que deve ser dito. Tudo no script. Inclusive a melhor e mais ordinárias das frases que todos nós já aprendemos a repetir: - “O Povo não sabe votar”!

Saber – 1. Ter conhecimento de. 2. Compreender, perceber; 3. Ter capacidade para 4. Reter na memória

“Para votar vá até a sua sessão eleitoral, apresente seu título de eleitor ou carteira de identidade. Vá até a urna e digite o número do seu canditato. Tecle a tecla confirma está computado o seu voto”.

O povo sabe votar. Todo ano ele escolhe um candidato, vai até a urna e vota. O problema é que os candidatos é que não sabem cumprir o que disseram para aquele pobre coitado que votou nele. O povo vota e vota certo. Os candidatos é que se revelam grandes bandidos e mentirosos. Não compactuamos e nem somos enganados. Somos forçados a escolher da corja o melhor ator no papel de político bonzinho e salvador da pátria que irá acabar com a miséria, desemprego, dar educação e segurança ao povo brasileiro e fazer a tão mítica reforma agrária. Piada né!

E desmoralizados seguimos para os próximos quatro, e mais quatro e mais quatro anos... Uns continuarão... outros enterrarão seus filhos, morrerão assassinados por filhos de outras que serão assassinados por filhos de outras...

Enquanto filhos de outros continuarão pousando para fotos cortando fitas de cetim com as cores da bandeira nacional revertendo seus impostos em investimentos para suas fundações que ostentam na porta seus nomes. Nossas vidas são moedas baratas pra eles, mas, que comercializam suas imagens e bancam suas promoções pessoais.

Patrícia Mess
Enviado por Patrícia Mess em 15/08/2008
Reeditado em 24/05/2011
Código do texto: T1130100
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