As coordenadas para o meu funeral
Leia com atenção tudo o que estiver aqui escrito, caso contrário, você será barrado no portão do cemitério no meu funeral!
Diferente de muitos – na verdade quase todos – eu penso no meu funeral e, aproveitando a oportunidade, já deixo as coordenadas de como eu quero que seja feito exatamente. Ah! Preciso avisar duas coisas antes de prosseguir.
Primeiro de tudo: Quem não se preocupar em seguir a risca meus desejos para este dia, não precisa sequer ir ao velório, quiçá, ao enterro.
Segundo de tudo: Não aconselho pensar que somente pelo fato de que eu não vou estar com voz ativa no dia que acontecer, ele poderá ser feito de qualquer forma porque senão eu juro, juro mesmo que volto de onde eu estiver para prestar contas! Estamos todos entendidos? Então podemos prosseguir!
Eu quero um sepultamento suntuoso e extremamente tradicional. Nada de ser cremado! Tenho certo pavor a este tipo de escolha. Quero ser enterrado num cemitério bonito, arquitetônico; esqueçam cemitérios com graminhas e pequenas lápides. Quero esculturas barrocas, românticas, simbolistas... Góticas! Inclusive no meu mausoléu! Quero algo pomposo.
Caixão branco NUNCA! É definitivamente brega, em minha opinião – que não corresponde necessariamente a verdade, digamos que é apenas uma questão de gosto. Quero um caixão de imbuia e envernizado, algo reluzente ainda que seja um dia nublado ou chuvoso. E se o dia for ensolarado, não quero, em hipótese alguma, que as pessoas estejam vestidas em cores. Quero preto e somente preto! Nem roxo, nem bordô, nem cinza, apenas preto. E quero roupas longas e elegantes acompanhados de grandes óculos de sol e guarda-chuvas, faça chuva ou faça sol, quero os dois; até porque quero que meu enterro seja por volta das 16:00hs, quando o sol estiver mais baixo.
Enquanto o padre estiver lendo suas sábias palavras quero todos de guarda-chuvas abertos e de óculos no rosto para esconder olhos marejados – ou quem sabe olheiras. Sim, marejados, certo? Nada de escândalos e berreiros! Quero discrição! E novamente repito: quem não seguir a risca, será convidado educadamente a se retirar do cemitério. Ah! Nada de memórias! Não quero absolutamente ninguém falando de como eu era e dos bons momentos juntos! Não, não, não. Deixem apenas o padre falar porque, mesmo que eu não tenha religião, o mais tradicional é um padre falando em latim. Na hora que o caixão estiver sendo finalmente enterrado, apenas Björk cantando it’s not up to you. Depois que o caixão já estiver fora da vista de todos e for hora de todos irem ou colocarem rosas no túmulo, por favor, ninguém conversando, não enquanto no cemitério. E rosas? Apenas vermelhas ou violetas, nada de muita cor e aroma. Bastam estas.
Depois que a cerimônia estiver acabada deste jeito que falei, podem até dar uma festa se assim quiserem, eu não ligo, até porque, pouco me importará que no meu funeral compareçam pessoas falsas; portanto que sigam minuciosamente minhas coordenadas, está bem.
Nada de barracos, sim? Discrição e elegância sempre em primeiro lugar. Qualquer dúvida, basta me perguntar enquanto estou vivo. Não sei por que me deu essa vontade de escrever sobre meu funeral. Talvez porque algo está pra acontecer, não sei. Enfim, é isso.