SERÁ O JORGITO?

SERÁ O JORGITO?

Nossa entrada nos Estados Unidos da América não poderia ser mais apoteótica. Voamos a noite toda pelas Américas sem nenhum problema, como falam os pilotos em “céu de brigadeiro”. Um dos comissários fica em frente a nossa poltrona e pergunta algo em seu inglês “batatônico”. O homem, fala rápido, inteligível. Então, olhamos para ele, jogando um olhar turístico, enigmático.

ele pergunta em espanhol:

_La senhora llevas comida ou liquido en su maleta?

Dissemos não! Reiteramos com a cabeça, as mãos.:

_No! No!

Enfim, o pouso da aeronave em Miami. E a seguir aquela movimentação de praxe. Ao sairmos da aeronave, um jovem, esperava na porta da aeronave, Seu rosto contraído, sem mostrar os dentes uma única vez. Esse sujeito com cara de lobo mau, segura uma cadeira de rodas para transportar Ângela. No seu crachá esta escrito: Jorge.

Ângela nem bem senta na cadeira, e, o tal do Jorge, a empurra freneticamente, rampa acima. Nossa! Foi um Deus nos acuda para acompanhá-lo. Ele abre as portas dos elevadores enfia a cadeira no seu interior, e nem me espera. Então, fico esperta! Na segunda porta coloco o pé para o elevador não fechar.

Para passar pela alfândega, o lobo mau, faz gestos para eu caminhar atrás dele. Começo a lembrar do moço do Brasil. Muito alegre repleto de paciência e dedicação, empurrou Ângela pelo aeroporto de Cumbica até a porta da aeronave. Ele se parecia com o personagem, Benedito de uma crônica em que Mário de Andrade escreve:

“O negrinho era quase só pernas, (…) macaco-aranha, num mexe-mexe aflito de pernas, seis, oito pernas, nem sei quantas.

_ Benedito me mostrava os dentes do seu riso extasiado, uns dentes escandalosos, grandes e perfeitos, onde as violentas nuvens de setembro se refletiam, numa brancura sem par...”

Pois o nosso Benedito, funcionário sorridente do aeroporto brasileiro, não se envergonha de mostrar a falta dos seus dentes. No seu rosto, o sorriso mostra a arcada dentária, e dá um que, de pobreza no seu ar bonachão.

_Mas, será o Benedito! _ falo ao imprimir maior velocidade para alcançar o mal educado pelos corredores intermináveis do aeroporto de Miami.

A esteira carrega as malas e preciso me ocupar de identificá-las para poder pegar uma a uma. E, como estão pesadas, por Deus! Angelita esta carregando uma ou duas lojas de produtos com o logotipo do Brasil. Camisetas, sandálias, brinquedos, enfim, tudo que portasse bandeiras brasileiras e estivesse impregnado das cores verde-amarela.

Com uma voz “caliente e terna” , Angela pede:

_Por favor, ayuda a ella a sacar sus maletas.

_ Pos que ella la saque, porque a mia obigacion e empurrar to Cia. E de favor estou sacando las tuyas.

_Será o Benedito!!

Sem conter o riso uma olha para a outra, e, em dueto:

_ Será o Jorgito!

E, através desse homem grosseiro fomos recebidas nos Estados Unidos da América. Passamos as malas pelo RX, e depois pela inquisição da alfândega norte-americana.

Depois de tirar a minha foto, olhar meus documentos, fazer algumas perguntas, o tal do funcionário, me liberou. Ângela já estava me esperando.

Encontramos a família de Ângela e ela pede, para eu dar 10 dólares de gorjeta para o Jorge. Pensei que era muito dinheiro, para o estúpido. Ele pega o dinheiro, sem olhar. Vira as costas sem agradecer e vai embora.

Vinte dias se passam. Ângela comenta a minha sorte de conseguir passar com três malas na alfândega, sem pagar os cem dólares, a mais pelo excesso de peso.

_Carinho! Eu trouxe somente duas malas.

_Como? São três malas.

_Não! Carinho, eu trouxe duas, a outra é “su” mala.

Muitas “sus” mala, depois...

_Mas, como? E aquela que levei a mais ao seu quarto?

_Aquela é sua Carinho!

_Não! Não pode ser! São sus malas!Vamos ver.

Ângela pega a mala e faz um não, com a cabeça resolve abri-la. Dentro da mala maior há uma menor, e, no interior dessa menor, outra mala, menor ainda, contendo, um paletó surrado, duas cuecas, duas camisetas usadas, mas, limpas, um pijama e um par de tênis, usado. Junto também uma agenda vazia, sem nenhuma palavra sequer escrita. Uma olha para a outra. Assustadas!

_Valha-me, Nossa Senhora de Guadalupe! pegamos a mala de outra pessoa.

_ Carinho, olha o risco que passamos e se nas malas tivesse cocaína ou uma bomba. Não quero nem pensar!

Fiz o sinal da cruz, repetidas vezes!

_Penso que não vamos devolver, pois será difícil explicar para as autoridades tudo o que nos aconteceu.

Ângela faz mais um sinal da cruz para se benzer.

_ Ângela, como vamos explicar que focinho de porco não e tomada? Ai, ai, ai que medo!

_Não podemos devolver depois de tantos dias! O seguro da American Air Lines vai cobrir a perda. Vamos doar tudo para os necessitados.

Tenho certeza, o Jorgito queria nos “por em uma fria”, mas, o nosso Santo Benedito, muito mais forte não deixou!

_Será o Jorgito!

Rimos, mas, com vontade de chorar por todo o acontecimento “periculoso” pelo qual passamos sem saber!