Pânico Não
Pânico Não
Fulanos e sicranos, malfeitores da vez, estampados nalguma mídia, não vão me causar pânico. De espécie alguma.
Agora, decerto me sentirei alarmado quando não mais ver aquela
mulher, não sei se dona de casa ou executiva, levando agasalhos e comida para a mendiga que dorme na calçada.
Desesperança sentirei quando não mais houverem passeatas e comícios pela paz.
Quando me disserem que já não se servem refeições gratuitas nos albergues, nas igrejas, e onde mais isso ocorra, para os milhares que por assim dizer, derraparam na própria existência, e necessitam daquele gesto para continuarem a estar, e talvez um dia passarem a existir.
Não será, pois, a presença da 4ª Frota e as profecias de araque que irão causar-me tormento maior do que se por ventura souber que a organização Cais do Parto não mais atua nos sertões, ajudando
milhares de futuras mães a cumprirem seu destino.
Ou quando ouvir dizer, de fonte confiável, que todos os grupos de Ioga, os templos Budistas, as Mesquitas e as Sinagogas, as Igrejas Católicas, os centros de oração Seicho-no-ie e as casa de Johrei, os grupos Socorristas, etc., fecharam suas portas.
Vou me sentir mal quando der pela falta de similares, tais como aquele casal, na esquina da Teixeira da Silva ao meio dia, executando “Carinhoso” no violino e no violão, com o chapéu no chão à espera de um trocado. Ou se algum estudo de segunda mão ensejar a alusão, de que não há mais pessoas decididas a viver do próprio talento e sim do esforço alheio, inadvertidas então que seus frutos não são para si próprios e sim para os outros.
Quando decretarem ser uma verdade absoluta que desapareceram todos os voluntários de pronto socorros e hospitais, que já não existem médicos atendendo de graça nas periferias e que todos os grupos de auto ajuda do mundo, que só funcionam graças ao serviço de seus membros, encerraram suas atividades.
Sentirei, sem sombra de dúvida, tremendo desconforto quando deixar de ler meus amigos e amigas, adeptos da escrita fina e oriunda da melhor inspiração, fazendo porque gostam e sabem fazer.
Ou quando alguma ala da ciência proclamar, como um decreto insofismável, a descoberta de que no planeta não mais nascerão pessoas como o trio Paulina/Marchetti/Balint. A primeira devotou sua vida aos ex-escravos brasileiros, porque alguém tinha que pensar neles. O segundo cuidou dos órfãos. O terceiro descobriu que os operários tinham direito à saúde, lazer e cultura. Nenhum dos três atuou, por um instante sequer, no doloroso circo denominado “política”.
Assim, não será qualquer manchete peçonhenta que irá tirar-me a paz de espírito, mas antes,e somente, se os descritos acima e os de igual quilate, não citados por falta de memória, deixarem de existir.
Aí sim sentirei pânico. Porque são estas pessoas que todos os dias, e sem a pretensão de, integram a formidável seita aqui chamada de Os Salvadores do Mundo.
Também vou perceber que há algo errado comigo, se um dia conseguir refrear o estúpido hábito de citar à esmo.
“Gente é pra brilhar, não pra morrer de fome”.