Carta aos ETs. Parte três (o começo de tudo).

Continuação da carta aberta a todos os seres da nova espécie dominante que vier a habitar estes confins quando largarmos o osso, ou então, que estiverem por aqui atrás de sacanagem.

Parte três.

12/03/2008

Há quem diga que o homem surgiu meio assim, do nada, criado por um camarada muito sagaz, que inventou o primeiro o homo sapiens macho, achou bacana, viu que a coisa tinha potencial, resolveu caprichar, e criou a fêmea. Depois disso, por algum motivo obscuro ficou meio puto, e largou os dois nesse mundão, juntos com o resto da bicharada.

Porém, atualmente uma grande parte da rapaziada já anda acreditando num tal de Charles, que dia desses, ao sair de férias, teve uma sacada brilhante: Percebeu que embora todos os bichos costumassem nascer iguais aos demais, vez ou outra, algum acabava nascendo diferente, a ponto de nascerem alguns, de certa forma, um pouco mais iguais que os outros[1], que por sua vez faziam menos besteira, morriam menos, e acabavam vivendo mais para transmitir geneticamente suas igualdades, até que, de repente, nascia algum mais igual ainda. E assim por diante.

Desta forma Charles, este malandro agulha, sem querer, acabou por revelar mais uma possibilidade para a origem do homem: o macaco. Teve gente que não curtiu a idéia, e preferiu ficar com a primeira hipótese, por mais incrível que esta pareça (as duas me parecem incríveis, cada qual por seus motivos).

Assim, de acordo com esta segunda corrente de pensamento, que ultimamente me parece a mais coerente (embora a coerência não esteja na moda hoje em dia), o Homo Sapiens Sapiens teria passado por inúmeros outros “Homos” antes de chegar até o atual “Homo”, como o Homo Habilis, o Homo Erectus (que em nada tem a ver com as divagações anteriores sobre disfunção erétil), entre tantos outros “homos”. Algumas outras espécies de “Homos” ainda podem ser vistas por aí, saltitantes, alegres e purpurinados. Não precisa nem procurar muito.

Assim, o homem acabou se tornando um bicho muito importante, um predador intrépido que aos poucos foi percebendo que podia tirar certa vantagem da sua situação. Não sei bem como ou quando foi isso, mas imagino que a coisa tenha sido mais ou menos assim:

Pedro, o homem das cavernas, ao caçar um animal de pequeno porte (que já andavam escassos pela região, ao contrário dos perigosos animais de porte médio, ou dos terríveis animais de porte grande), acabou encontrando Pedro[2], que por uma incrível coincidência, estava a caçar o mesmo animal.

Assim, quando ambos perceberam a peculiaridade da situação, travaram o seguinte diálogo:

Pedro, muito mais simpático que Pedro, começa a conversa:

- Pedro, meu nobre amigo! Bom dia! Como anda Vossa Mercê neste dia tão ensolarado?

Pedro, um pouco transtornado com a situação, responde:

- Nobilíssimo Pedro! Folgo em lhe ver bem! Vou muito bem, obrigado! E o senhor, como vai? Tudo bem com as crianças, e com a sua senhora?

E após alguns momentos gastos com trocas de gentilezas entre os dois cavalheiros, conforme a situação exigia, Pedro foi direto ao assunto:

- Pois bem, distinto colega. Vejo que perseguimos o mesmo animal, e agora estamos num impasse... De acordo com o protocolo, podemos lutar até a morte, ou cortar o pobre bichinho no meio. O que o senhor preferiria?

Pedro, quiçá iluminado pelo absurdo da situação, respondeu de imediato:

- Pedro, meu caro, Talvez haja solução diversa para tal litígio: Que tal um acordo?

Pedro, num misto de curiosidade e desconfiança, retruca:

- Acordo... Pois bem. Como seria tal acordo?

Pedro, muito mais perspicaz, responde sem pestanejar:

- Façamos o seguinte: O senhor se compromete a não me matar, eu me comprometo a não lhe matar, e nós, cooperativamente, matamos um bicho maior.

Pedro, sem ter a menor idéia do que significava “cooperativamente” (afinal de contas, o conceito tinha sido inventado por Pedro naquele exato instante), mas empolgado com as possibilidades de conseguir “muita carne” ao invés de “pouca carne” (dois dias depois ele criou o conceito de “açougue”), concordou na hora.

Assim, cooperativamente, ambos caçaram vários animais de médio porte, até proporem sociedade a Pedro, um terceiro interessado, ao qual foi apresentado um contrato de adesão tanto quanto obscuro (em tal momento, Pedro e Pedro, agora já “advogados associados”, estavam criando o conceito de “estelionato”), que então, ao ingressar em tal empreendimento, possibilitou uma nova tecnologia: A caça de animais de grande porte.

A partir daí, a coisa ficou bacana, e o homem se tornou o grande predador do planeta.

Porém, engana-se quem pensa que o segredo de tudo foi apenas cooperação: Tantos outros animais, como formigas ou abelhas, já conheciam este conceito muito antes do homem.

O que nos leva a concluir, lamentavelmente, que ser grande e mau também ajudou bastante.

[1] Como já diria George Orwell.

[2] De acordo com o brilhante filme “Na idade da pedra” (RRRrrrr!!!, 2004), todos os homens se chamavam “Pedro” nesta época. A seguir, alguns comentários sucintos sobre o filme: é francês e me fez rir.

Herr Brehm
Enviado por Herr Brehm em 01/08/2008
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