O encontro com objeto sonhado

De fato no dia anterior havia passeado a pé pela Praça Getúlio Vargas. Note que o sabiá havia lhe impressionado por isso cruzou a Rua Barão do Rio Branco em silêncio. Dirigiu-se até o galho da árvore com a mão em concha na orelha. De fato no trânsito ocorreu aquela senhora. Dona Eugênia mãe de grandes e velhos amigos. Avistou de relance o rosto tão lindo e puro de Eugênia. Tamanha imaterialidade do momento modificou a atenção puxada para o lado do sabiá na árvore urbana. O carro sumiu em segundos. Decerto Eugênia partia para Pelotas de mala e cuia. Não raro retornavam ao rincão. Pôde vê-la rapidamente ao volante. Nunca imaginou que algo ocasional fosse tão carregado de significado. Sentiu que era preciso estar alerta pelo fato de não haver um só tipo de embriaguez. Poderia ter sido atropelado passeando em grande altitude. Movido por canto de pássaro em plena rua. Logo a ilusão é um carro para o alto. Ontem no bar o motorista de ônibus lhe disse algo preocupante sobre o seu filho menor. Ele estava tocando guitarra imaginária no meio da rua. Indagou isso na frente dele.

- É verdade? O garoto respondeu.

- Sim. O sim de merengue desmaiado dessa idade oca. Havia uma lição com aviso de perigo vindo de motorista. Motorista de ônibus. Uma coisa bonita educar o jovem sobre as múltiplas alterações da atenção. O curioso efeito “ser-balão” de toda embriaguez sem bússola, nem sequer comunicação, merece extremo cuidado.

Depois partiu cedo de seu passeio na praça direto para casa. Divertido com a vida noturna onírica lhe determinando um estágio emocional. Preferia isso à confusão que se faz com a lua no céu das torres. Intersecção do quanto se quis uma resposta interna justo nesse pequeno ciclo de oito horas para constatação de haver apenas um clarão da lógica como resultado inexato. Uma irradiação dos sentidos compensados. O que se passa é quase sempre a sensação de retalho sobre obra maior esquecida na dormência. Gostava de atribuir ao fenômeno o melhor número de palavras possíveis. Anestesiado natural e sem prejuízo de ser a preguiça uma parte da perfeição no calor do leito.

De manhã acordou inspirado dizendo em tom lírico sobre aspecto inacabado de acontecimento paradisíaco: O lirismo acabou. O conhaque acabou. Só o Drummond não terminou. Havia sinceridade como elogio defasado na vigília do relógio quebrado no tempo poético. Sonhar como reservatório para o insuportável porque ao adormecer anulamos certa parte do medo. Adormecer é um abandono forçado. Optamos pela tremenda força com que desabamos estrelas no vazio suspenso entregues aos transportes de Morfeu entoando uma canção perfeita. A voz poderosa do silêncio consagrando um apelo simples: Dorme sobre a eternidade. Nós cuidamos de ti, segue. O todo te guarda em tudo. Sonhar nada mais é do que um pequeno conforto traduzido em alma.

É importante lembrar que a senhora estava no sonho e dentro dele relembrando-o dentro da sensação do truque dos espelhos sobrepostos. Pois havia de fato entrevisto a senhora no carro. O sonho lhe dizia imantado para que mantivesse o cuidado de separar isso. Que não confundisse o aviso mágico. Havia encontrado alguém duas vezes além de ter transportado uma carga de significado excedente. Uma espécie de imagem lá dentro. Para lembrar ainda a ponto de dizer havido em verdade e vivido esse detalhe. Minúcia do qual lembraria diante da nova situação. Estava correto: sonho nada mais é do que conforto traduzido em alma. A doce senhora... Mesmo distante lhe fazia feliz... Como resultado. Mas avisava irreal.

...................................................................