Casebre e pó
“Não penso no que penso: penso”
Compreender nunca fez parte da mágica sensação que é o deslumbramento; hoje sei disso. Essa mensagem à porta, que de modo algum compreendi na primeira vez que suas letras refletiram luz em meus olhos, era mais mágica que a própria mágica, porque, além de secreta, transmitia um sentido novo para cada um que a lia (sei somente agora o quanto me valeu; muito me valeu). Antes que me convertam ao mistério, apresento-me: Chrono Gates. Ainda que meus meios não sejam as palavras, usar-lhes-ei, atrizes – minha peça teima em autodenominar-se, chama-se a si própria de vida.
Ao abrir a porta, logo após a magnífica sensação que antes representei, dei-me de frente com pó. Sim: pó. O quão rústicos são os telhados dos casebres: pelo pouco tempo que o deus vento se faz presente, torna-se em eternidade – esta, todavia, passou a chamar-se sujeira. Aos desatentos, explico: não vislumbrei uma casa abandonada, isso de forma alguma, (os móveis, por sinal, encontravam-se todos bem colocados, e com muito gosto, se tratando do dono da casa) a questão é que não passava ninguém por ali há três dias, pelo pó que o tempo chuvoso acumulou.
Desejo retroceder um pouco para explicar-me. Estive nesse mesmo lugar há cerca de dez anos – sei que não se lembram; é verdade, faz, afinal, muito tempo. Se não sigo uma linha no que escrevo (escrevo? Não, não, de forma alguma: no que relato. Sim, no que relato, conserte isso) é por pura vontade, a mãe de nossos desejos. Colocar pontos em linha reta é querer reto formar uma reta – e, por favor, chega de repetições. Por fim, voltemos a antes de voltar.
Sentei-me em uma cadeira de balanço, que tanto gosto, e esperei. Com minhas memórias secas, refleti (Estarei dando a entender que memórias refletem? Quanto confuso sou; sim, confuso) sobre o que havia me dito ele antes: “andar em silêncio, e só, é ter infinita companhia perto de si: o vento ocupa todo o espaço”. Que queria dizer esse louco em corpo de um poeta? Vazio estou... Creio que os que agora me lêem estejam curiosos, desejosos por conhecer tamanha figura enigmática; entendo, e peço: carreguem os detalhes, pois só eles valem (seria o que ele diria? Mas foi o que eu disse, ora! Anule as aspas: deixe-me ser um pouco vil).
Pouco carreguei desta data: tarde virou noite; noite, virou dia; dormi.
Descartando dois dias de descanso – que aos seus olhos cansados de nada valerão – retrato o que em seguida vivi.
ps: Continua. Sinto não puder publicar agora a continuação, entretanto o mais breve que puder, publicarei. Obrigado.