Um e outro.

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Um vinha de um lado da ponte, o outro vinha do outro. Fatalmente eles iriam se cruzar.

A ponte era ampla e mal iluminada, e naquela madrugada de domingo não passava uma pessoa sequer. Apenas os dois estavam ali.

Um estava bem vestido, com bermuda e camisa de marca, era negro, forte, cicatriz tomando parte do rosto. Fumava um cigarro preto. O outro era branco, maltrapilho, barba de três dias, com as bordas da camisa já comida pelas traças, uma calça jeans surrada e um boné antigo. Tinha uma tatuagem que tomava todo o seu antebraço.

A distância que os separava era considerável, mas eles iriam se encontrar exatamente no meio da ponte. Não existia outra via por qual eles pudessem desviar o caminho: A ponte não tinha acessos em suas laterais.

Um avista o outro. Ambos ainda não conseguem identificar quem está vindo, apenas um vulto se movimenta em direção contrária. O lugar macabro facilita a visão assombrosa de cada um deles. O medo também parece se aproximar dos dois, vindo a passos mais largos. A distância é cada vez menor.

Um deles tira a camisa, num sinal de intimidação. O outro, põe a mão por dentro da blusa, ameaçando tirar algo debaixo dela que até aquele momento não se mostra.

A distância torna-se pequena a ponto de um identificar a fisionomia do outro. Encaram-se num sinal machista. O medo de um é o medo do outro.

O negro, rapidamente acende outro cigarro. Tragadas fortes. Os passos continuam na mesma intensidade das tragadas.

Estão muito próximos. Nesse momento, param de se encarar e olham apenas para frente fingindo estarem sozinhos. Somente o reflexo acusa os movimentos do outro que passa.

Cruzam-se. Os dois, simultaneamente, param e olham para trás. Os olhares se confrontam. Então finalmente os dois correm. Um para o lado, e o outro, para o outro.

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Lucas Pimentel

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