O crânio de meu pai...

Um dia tive o crânio de meu pai em minhas mãos. Não entendi a expressão dos seus olhos, que não eram olhos e sim cavidades melancólicas. Também não entendi uma só palavra que não saía de sua boca, cerrada pela dentadura que exprimia um não sei o quê.

Pude alisar os parcos cabelos, agora loiros, que teimavam em resistir ao tempo, que tivera tempo para renascer e não renascera, mas que continuavam charmosos e penteados.

Pedi ao céu ou ao inferno que me enviasse ao menos um gesto, que transferisse apenas um pensamento de seu crânio para o meu crânio. Nada!

Sua figura está morta nos meus pensamentos vadios e, sobretudo, seu crânio estava morto em minhas mãos vadias.

As caveiras poderiam ter vida. Seriam, ainda que sem o devido charme, o outro ciclo de nossa existência. Não existiria vaidade, ou existiria? Talvez um fêmur mais vistoso ou um crânio mais formoso. Não sei.

Anulo todas as possibilidades deste ciclo, afinal, não existiria o por quê.

Um dia tive o crânio de meu pai em minhas mãos...